O padre Gustavo Gutiérrez Merino (1928-2024) foi o principal articulador da teologia da libertação. Esta corrente começou a se desenvolver nos anos 1950, ganhando força através da ação política de bispos do continente e se consolidando durante a assembleia do Conselho Episcopal da América Latina e Caribe (CELAM) em Medellín, Colômbia, em 1968, onde foi estabelecida a "opção preferencial pelos pobres" como diretriz da Igreja na América do Sul.
A originalidade da abordagem de Gutiérrez estava na incorporação de conceitos das ciências sociais e do pensamento político de esquerda em sua teologia, que se tornou especialmente influente na Igreja brasileira durante as décadas de 1970 e 1980. O Papa Francisco, em entrevista ao El País em janeiro de 2017, expressou uma visão positiva sobre o movimento, afirmando: "A teologia da libertação foi uma coisa positiva na América Latina".
Durante o papado de São João Paulo II, a congregação para a Doutrina da Fé conduziu uma investigação sobre o tema, resultando em duas instruções, a Libertatis nuntius e a Libertatis conscientia, publicadas em 1986, ambas foram assinadas pelo cardeal Joseph Ratzinger.
Uma teologia crítica ao estilo escola de Frankfurt
A libertação em sua teologia possui três dimensões interligadas: libertação política e social das estruturas opressivas, libertação humana ao longo da história (desenvolvimento humano) e libertação do pecado através da comunhão com Deus.
Em seu livro seminal "Teología de la liberación: Perspectivas" (1971), Gutiérrez argumenta que a pobreza é resultado de estruturas injustas e que a salvação cristã não pode ser divorciada da realidade histórica e política. Para ele, a pobreza não é uma fatalidade, mas uma condição social construída que contradiz o plano de Deus.
Um aspecto distintivo de seu pensamento é a união entre fé e vida política. Para Gutiérrez, a reflexão teológica deve partir da prática (práxis-termo marxista) - especialmente a prática da libertação dos pobres - e não apenas de conceitos abstratos. Ele argumenta que a teologia deve ser um segundo ato, vindo depois do compromisso com os pobres e a luta por justiça.
Gutiérrez também enfatiza que a pobreza tem um caráter estrutural e não meramente individual, exigindo mudanças sistêmicas além da caridade pessoal. Ele defende que a Igreja deve ter um papel ativo na transformação das estruturas sociais injustas.
Sua teologia incorpora elementos da análise social marxista como ferramenta de análise da realidade, embora rejeite o materialismo ateu do marxismo. Este foi um dos pontos mais controversos de sua obra e que gerou maior debate dentro da Igreja.
Para Gutiérrez, a salvação cristã inclui necessariamente a libertação histórica, ainda que não se reduza a ela. Ele argumenta que não se pode separar a história humana da história da salvação - elas são uma única história vista de diferentes perspectivas.