👑São Luís IX, que reinou na França de 1226 a 1270, personificou o ideal do monarca cristão. Movido por uma fé profunda, dedicou seu reinado à promoção da justiça, ao cuidado dos pobres e à defesa da Cristandade. Como membro da Ordem Terceira Franciscana, viveu uma vida de piedade e penitência pessoal em meio às responsabilidades da coroa. Ele via seu poder real não como um direito, mas como um dom de Deus a ser negociado para a glória divina e o bem de seu povo, o que o levou a empreender duas Cruzadas, morrendo de peste perto de Túnis durante a segunda, testemunhando sua fé até o fim.
📖 Introito (Sl 78, 11. 12 e 10 | ib., 1 )
Os justi meditábitur sapiéntiam, et lingua ejus loquétur judícium... A boca do justo fala a sabedoria e a sua língua profere a equidade. A lei de seu Deus está em seu coração. Sl. Não tenhas ciúmes dos maus, nem tenhas inveja dos que praticam a iniquidade.
📜 Epístola (Sab 10, 10-14 )
O Senhor conduziu o Justo [Jacó] por caminhos retos, mostrou-lhe o reino de Deus, e deu-lhe a ciência das coisas santas: enriqueceu-o pelo trabalho e recompensou as suas fadigas. Auxiliou-o contra os avarentos opressores e cobriu-o de honra. Guardou-o dos inimigos, defendeu-o dos sedutores e permitiu-lhe duro combate, para que vencesse e soubesse que de todas as coisas, a mais poderosa é a sabedoria de Deus. Foi ela que não desamparou o Justo, quando foi vendido [José] e livrou- o dos pecadores; desceu com ele à prisão e não o abandonou nas cadeias, até lhe depositar em mãos o cetro do reino e o poder sobre os seus opressores. Ele mostrou que eram mentirosos os que o tinham caluniado. E o Senhor, nosso Deus, lhe deu uma glória eterna.
✝️ Evangelho (Lc 19, 12-26)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos esta parábola: Um homem, de nobre linhagem, retirou-se para uma região longínqua a fim de receber um reino e depois regressar. Chamando dez de seus servos, deu-lhes dez minas, [moedas de prata] e lhes disse: Negociai com elas, até que eu regresse. Seus concidadãos, porém, o odiavam e lhe enviaram uma embaixada, dizendo: Nós não queremos que este homem reine sobre nós. Ora, aconteceu que ele voltou, após ter tomado posse de seu reino, e ordenou que chamassem os servos aos quais dera o dinheiro, para saber como eles o tinham valorizado. Apresentou-se, pois, o primeiro, dizendo: Senhor, a tua mina produziu dez minas. E ele respondeu: Está bem, servo bom, porque foste fiel em pouca coisa, terás poder sobre dez cidades. Veio o segundo e disse: Senhor, a tua mina produziu cinco minas. E ele lhe disse: E tu, sê o senhor de cinco cidades. Um outro veio depois, dizendo: Senhor, eis a tua mina que eu guardei, envolta num lenço, porque tinha medo de ti, por seres um homem severo; tiras o que não depositaste e recolhes o que não semeaste. Disse-lhe ele: Por tua própria boca, eu te julgo, servo mau. Sabias que sou um homem severo, tirando o que não depositei e recolhendo o que não semeei. Por que então não puseste o meu dinheiro num banco, a fim de que, em meu regresso, eu o retirasse com os juros? E aos que estavam presentes, disse: Tomai-lhe a mina, e daí-a ao que tem dez. E eles disseram: Senhor, este já possuí dez minas. Eu vos digo, retrucou o Senhor, dar-se-á ao que já tem e ele ficará na abundância, mas ao que não tem, tomar-se-á mesmo o que possui.
🤔 Reflexões
⚖️O "homem de nobre linhagem" é Cristo, que ascendeu ao céu para receber o Reino, e as "minas" são os dons da graça e as responsabilidades que Ele confia a cada um segundo sua vocação, como o poder régio confiado a São Luís. São Gregório Magno ensina que "negociar" com a mina significa usar os dons recebidos para o ganho espiritual, aplicando-os no serviço ao próximo; o servo preguiçoso é aquele que, por temor ou egoísmo, se retrai do esforço que a virtude exige, guardando para si os dons que deveriam frutificar para a comunidade (Homilias sobre os Evangelhos, 9). Santo Agostinho complementa, afirmando que os servos fiéis que multiplicam as minas são aqueles que, pela pregação e pelo exemplo, trazem outros a Cristo, e a recompensa de governar "cidades" simboliza o poder de guiar e edificar almas na Igreja (Sermão 107). Assim, o rei santo não enterrou seu poder, mas o investiu na justiça e na fé, multiplicando os frutos do Reino de Deus em seu próprio reino terreno, espelhando o Justo da Epístola, a quem a Sabedoria Divina "depositou em mãos o cetro do reino".
🧐A parábola das minas em Lucas tem um paralelo na parábola dos talentos em Mateus (25, 14-30). Em Mateus, o senhor distribui diferentes quantias (cinco, dois e um talento) "a cada um segundo a sua capacidade", enquanto em Lucas cada um dos dez servos recebe a mesma quantia de uma mina, sublinhando a igualdade da chamada inicial. Ademais, Lucas introduz um elemento político ausente em Mateus: os concidadãos que odeiam o nobre e enviam uma mensagem dizendo "Nós não queremos que este homem reine sobre nós", uma clara alusão à rejeição de Cristo por parte de alguns. A recompensa em Lucas é também mais explícita em termos de governo ("terás poder sobre dez cidades"), enquanto em Mateus é mais geral ("entra na alegria do teu senhor").
🖋️O ensinamento de São Paulo sobre a mordomia e a responsabilidade ecoa a mensagem do Evangelho. Em 1 Coríntios 4, 2, ele afirma: "o que se requer nos administradores é que cada um seja encontrado fiel", definindo o cristão como um "steward" ou administrador dos mistérios de Deus, tal como os servos da parábola. Em Romanos 12, 6-8, Paulo detalha os diferentes dons (carismas) distribuídos na comunidade, exortando cada um a usá-los com diligência – "o que preside, com cuidado" –, o que se aplica diretamente à vocação de um rei como São Luís, que recebeu a "mina" da autoridade. A advertência sobre o julgamento final é reforçada em 2 Coríntios 5, 10, onde se lê que "todos devemos comparecer ante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o que tiver feito por meio do corpo, ou bem, ou mal".
🏛️Os documentos da Igreja consistentemente ensinam que toda autoridade civil deriva de Deus e deve ser exercida para o bem comum e a glória divina. A encíclica Immortale Dei do Papa Leão XIII afirma que os governantes têm a obrigação de honrar a Deus e proteger a religião, pois são Seus ministros. Esta doutrina reflete a parábola, na qual o rei justo, como São Luís, é o servo que administra seu "reino" em nome do Senhor que lho confiou. A encíclica Quas Primas do Papa Pio XI, ao instituir a festa de Cristo Rei, condena a mentalidade dos "concidadãos" rebeldes da parábola, denunciando o laicismo que exclama "Não queremos que Ele reine sobre nós" e reafirmando que tanto indivíduos quanto Estados estão sob o domínio de Cristo.