Contudo, observa-se que a erosão do sentido do pecado, temida por Pio XII, encontrou um catalisador inesperado e trágico nas próprias estruturas que deveriam ser seu antídoto. A partir de um certo ponto da história eclesiástica recente, uma nova orientação teológica e pastoral, imbuída de um otimismo antropológico e de um desejo de diálogo com o "mundo moderno", começou a minimizar sistematicamente a realidade e a gravidade do pecado. A ênfase deslocou-se da ofensa a Deus e da necessidade de reparação para uma abordagem mais psicologizante e sociológica, onde o "pecado" se transmuta em "falha", "limitação" ou "problema estrutural".
Esta nova mentalidade, disseminada por meio de catequeses diluídas, uma liturgia alterada que obscurece a natureza sacrificial da Missa em favor de um ágape fraterno, e uma pregação que evita temas como o juízo particular, o inferno e a necessidade da penitência, contribuiu decisivamente para o entorpecimento da consciência moral. A noção de que certas religiões não-cristãs são meios de salvação, ou que a liberdade religiosa implica uma indiferença estatal à verdade objetiva da Fé Católica, corrói a unicidade de Cristo como Redentor e, por conseguinte, a seriedade do pecado que Ele veio expiar.
A consequência direta é a promoção de uma falsa misericórdia, desvinculada da justiça e da verdade. Se o pecado já não é visto como uma ofensa capital contra a Majestade Divina, que exige contrição, confissão e satisfação, então a graça obtida no Calvário, mencionada por Pio XII como essencial, perde sua urgência e significado redentor. As "ambições ilícitas do homem pecador" florescem não apenas na sociedade secular, mas também dentro do tecido eclesial, quando a clareza doutrinária sobre o pecado e suas consequências é substituída por um humanismo vago e sentimental. A legislação humana e os pactos internacionais, como bem previu o Pontífice, mostram-se impotentes; mas, de forma ainda mais alarmante, as novas abordagens pastorais e litúrgicas pós-conciliares, ao invés de fornecerem o "fluxo pleno e constante de graças", parecem ter contribuído para aprofundar a crise, obscurecendo o caminho iluminado pelo Sermão da Montanha e a força que emana do Gólgota, tal como tradicionalmente compreendidos e transmitidos pela Igreja. A recuperação do sentido do pecado, portanto, exige um retorno integral à doutrina e à práxis sacramental que sempre o definiram com clareza e o combateram com eficácia.
Referências
Pio XII. Mensagem de Rádio de Sua Santidade Pio XII aos participantes do Congresso Catequético Nacional dos Estados Unidos em Boston. Palácio Pontifício em Castel Gandolfo. Sábado, 26 de Outubro de 1946.
Anthony Cekada, Work of Human Hands (2010).