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sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Vaticano II - Mudanças revolucionárias

O Concílio Vaticano II, nas palavras do cardeal Suenens, foi uma Revolução Francesa dentro da Igreja, a revolução que João XXIII queria, segundo o maçom Marsaudon. Talvez seja Congar quem melhor tenha definido a obra do Vaticano II:

'O Concílio liquidou o que eu chamaria de incondicionalidade do sistema. Entendo por "sistema" todo um conjunto muito coerente de ideias transmitidas pelo ensino das universidades romanas, codificadas pelo direito canônico, protegidas por uma vigilância rígida e bastante eficaz nos tempos de Pio XII, com prestação de contas, chamados à ordem, submissão dos escritos a censuras romanas, etc.; em resumo, todo um "sistema". Pois bem, pela obra do Concílio, esse sistema foi desintegrado.'" (Congar, Une vie pour la vérité, Centurion, 1975, p. 220)

As citações de Suenens e Congar refletem o impacto profundo do Concílio Vaticano II (1962-1965) na Igreja Católica, comparando-o a uma espécie de "revolução" interna. 

Concílio Vaticano II como "Revolução Francesa" da Igreja:

Reforma Litúrgica: O Concílio promoveu uma reforma radical da liturgia, que incluía a celebração da Missa no vernáculo (língua local) em vez do latim, o que tornou o culto mais acessível aos fiéis. A reforma litúrgica representou uma mudança significativa, alterando práticas que haviam permanecido quase inalteradas por séculos.

Mudança na Visão da Igreja: O Concílio alterou a compreensão eclesiológica da Igreja, passando de uma estrutura rígida e hierárquica para uma visão mais inclusiva e comunitária. O documento "Lumen Gentium" redefiniu a Igreja como "o povo de Deus", enfatizando a participação de todos os batizados (leigos e clérigos) na missão da Igreja, desafiando a centralização do poder no clero e no Vaticano.

Diálogo com o Mundo Moderno: O Vaticano II promoveu uma abertura ao diálogo com o mundo moderno, adotando uma abordagem mais pastoral e menos dogmática em documentos como "Gaudium et Spes" (Constituição Pastoral sobre a Igreja no Mundo Moderno). Esta nova atitude foi uma "revolução" na maneira como a Igreja se relacionava com o mundo, com outras religiões e com a sociedade secular.

Ecumenismo: Outro aspecto revolucionário foi a promoção do ecumenismo e do diálogo inter-religioso. O documento "Unitatis Redintegratio" (Decreto sobre o Ecumenismo) incentivou o respeito e o diálogo com outras denominações cristãs, uma postura que marcou uma ruptura em relação à exclusividade eclesial do passado.

Yves Congar sobre o "Sistema" da Igreja Desintegrado pelo Concílio:

Flexibilização do Magistério: Antes do Concílio, o magistério da Igreja (autoridade de ensinar) era altamente centralizado e rígido, especialmente sob o papado de Pio XII, que era conhecido por manter um forte controle sobre a doutrina, frequentemente através de censuras e proibições de escritos teológicos. O Vaticano II relaxou essas restrições, permitindo uma maior diversidade teológica e liberdade de discussão dentro da Igreja.

Descentralização do Poder: A centralização do poder em Roma foi desafiada pelo Vaticano II. O Concílio promoveu uma maior autonomia para as conferências episcopais (reuniões regionais de bispos), incentivando um maior envolvimento local e regional nas decisões e na governança da Igreja, o que significava um enfraquecimento do controle direto do Vaticano sobre todos os aspectos da vida eclesial.

Reavaliação do Direito Canônico: O direito canônico, que havia sido codificado de maneira rigorosa em 1917, começou a ser revisado após o Concílio. Essa revisão culminou no novo Código de Direito Canônico de 1983, que refletiu uma visão mais pastoral e menos jurídica da vida e disciplina da Igreja.

Liberdade de Consciência e Direitos Humanos: O Concílio, por meio da "Dignitatis Humanae" (Declaração sobre a Liberdade Religiosa), reconheceu a liberdade de consciência e a dignidade de cada pessoa em escolher sua própria fé, algo que contrastava com o "sistema" anterior, que havia promovido uma visão mais autoritária e menos tolerante da liberdade religiosa.

Redução da Vigilância Doutrinária: A menção de Congar a "chamados à ordem", "submissão de escritos a censuras romanas", etc., refere-se ao rígido controle doutrinário antes do Vaticano II, que incluía, por exemplo, o Índice de Livros Proibidos e o monitoramento de teólogos considerados suspeitos. O Concílio, ao incentivar o diálogo teológico e a abertura, diminuiu significativamente essa vigilância estrita.

Revolução do Papa João XXIII:

Segundo Marsaudon, citado por Suenens, o Concílio Vaticano II foi a "revolução que João XXIII queria". O Papa João XXIII, ao convocar o Concílio, tinha como intenção atualizar a Igreja para que ela pudesse melhor responder aos desafios do mundo moderno.
Contexto e Fatos Explicativos:

"Aggiornamento" (Atualização): João XXIII usou o termo "aggiornamento" para descrever seu objetivo de renovar a Igreja, tornando-a mais relevante e acessível no contexto contemporâneo. Essa atualização incluía reformas em práticas litúrgicas, uma nova abordagem pastoral, e um diálogo mais aberto com a sociedade moderna.

Uma Igreja Pastoral e não Politizada: João XXIII queria que o Concílio se concentrasse em questões pastorais, em vez de reforçar a luta contra o comunismo ou reafirmar a autoridade política da Igreja. Ele desejava uma "Igreja pobre e para os pobres", mais humilde e menos interessada em exercer poder temporal.