O texto do Credo, em sua superfície, reafirma muitas verdades centrais da fé católica perene. Encontramos ali menções à Santíssima Trindade, à Encarnação do Verbo, à obra redentora de Cristo, à Presença Real na Eucaristia através da Transubstanciação, ao Pecado Original, aos dogmas marianos, à Igreja una, santa, católica e apostólica, à necessidade da Igreja para a salvação, à infalibilidade papal (embora curiosamente não invocada para este Credo), à realidade do Céu, Inferno e Purgatório, e à ressurreição dos mortos. O propósito declarado era fornecer um ponto de referência seguro contra as "perturbações" e "incertezas" que afligiam os fiéis.
Contudo, para uma análise verdadeiramente católica, informada pelo Magistério constante da Igreja e pelos princípios da teologia, a primeira e mais crucial questão a ser levantada é a da autoridade. Quem promulgou este "Credo"? Um verdadeiro Vigário de Cristo ou um herege público que, por esse mesmo fato, perdeu qualquer ofício eclesiástico, conforme ensinado por teólogos de peso como São Roberto Belarmino (cf. De Romano Pontifice, Livro II, Capítulo 30)? Se Montini, através da promulgação e imposição de doutrinas e práticas contrárias à fé católica (como a liberdade religiosa do Vaticano II, o ecumenismo indiferentista e o Novus Ordo Missae), já havia manifestado sua defecção da fé, então este "Credo", por mais ortodoxo que pareça em certas passagens, carece de qualquer valor magisterial autêntico. Seria, no máximo, a profissão de fé de um indivíduo particular, e não um ato do Papado.
Ademais, mesmo que se concedesse, arguendo, a ortodoxia formal de grande parte do texto, o "Credo do Povo de Deus" não pode ser examinado isoladamente do contexto revolucionário em que foi emitido.
Como pode o mesmo "pontífice" que solenemente proclama a Transubstanciação ser aquele que impôs o Novus Ordo Missae (1969)? Este novo rito, como a análise crítica do Cardeal Ottaviani e Bacci ("Breve Exame Crítico do Novus Ordo Missae") e estudos subsequentes demonstraram, representa um "impressionante afastamento da teologia católica da Santa Missa como formulada na Sessão XXII do Concílio de Trento". Ele obscurece o caráter sacrificial da Missa, aproxima-se perigosamente da teologia protestante da Ceia e minimiza a Presença Real.
O Credo menciona que a Igreja de Cristo "subsiste" na Igreja Católica, ecoando a infame formulação de Lumen Gentium (LG 8) do Vaticano II. Enquanto a doutrina tradicional sempre ensinou que a Igreja de Cristo é a Igreja Católica (cf. Pio XII, Mystici Corporis Christi), a noção de "subsistit in" foi explorada para abrir portas a um falso ecumenismo, sugerindo que a Igreja de Cristo pode existir, de alguma forma, também fora da estrutura visível da Igreja Católica.
Como conciliar as afirmações do Credo sobre a unicidade da Igreja e sua necessidade para a salvação com a declaração Dignitatis Humanae do Vaticano II sobre a liberdade religiosa, que concede um direito civil a todas as religiões para propagarem seus erros publicamente? Isto contradiz frontalmente o ensinamento constante dos Papas (e.g., Pio IX, Quanta Cura e Syllabus Errorum; Leão XIII, Immortale Dei e Libertas Praestantissimum). Como harmonizar a fé na Igreja "una" com a prática ecumênica promovida por Montini, que tratava seitas heréticas e cismáticas como se fossem caminhos válidos para a salvação, em direta oposição a Pio XI em Mortalium Animos?
Crucialmente, o Credo de Montini, mesmo reafirmando verdades antigas, falha em condenar os novos erros que emanavam do Vaticano II e que eram ativamente promovidos pela hierarquia modernista. Não há uma condenação explícita do novo ecumenismo, da nova noção de liberdade religiosa, da colegialidade que subverte o primado papal, ou das tendências que levariam à criação do Novus Ordo Missae.
Portanto, o "Credo do Povo de Deus", quando analisado sob a luz da Tradição e da consistência doutrinária, surge menos como um farol de ortodoxia e mais como uma cortina de fumaça. Poderia ser visto como uma tentativa de Montini de aplacar as preocupações dos católicos mais conservadores, oferecendo-lhes palavras familiares enquanto, simultaneamente, ele presidia a demolição sistemática da fé e da prática católicas através da implementação das reformas conciliares. Um documento não pode ser julgado apenas por suas afirmações positivas, mas também por suas omissões e pelo contexto e ações de quem o promulga.
Em suma, para o católico que compreende a natureza da crise pós-Vaticano II como uma ruptura fundamental com o passado católico, o "Credo do Povo de Deus" de Montini é, na melhor das hipóteses, uma anomalia irrelevante vinda de uma autoridade duvidosa ou inexistente e, na pior, uma peça de engano destinada a dar uma falsa aparência de continuidade enquanto a revolução modernista consolidava seu domínio. A verdadeira fé não se encontra em documentos isolados de uma "hierarquia" que abraçou o erro, mas no depósito imutável da fé, guardado e ensinado pela Igreja Católica antes da catástrofe conciliar.
Referências
Paulo VI. Sollemnis Professio Fidei (Credo do Povo de Deus). 30 de junho de 1968.
Concílio Vaticano II. Constituição Dogmática Lumen Gentium.
Concílio Vaticano II. Declaração Dignitatis Humanae.
Cardeais Ottaviani e Bacci. Breve Exame Crítico do Novus Ordo Missae. 1969.
Papa Pio XII. Encíclica Mystici Corporis Christi. 1943.
Papa Pio IX. Encíclica Quanta Cura e Syllabus Errorum. 1864.
Papa Leão XIII. Encíclica Immortale Dei. 1885.
Papa Leão XIII. Encíclica Libertas Praestantissimum. 1888.
Papa Pio XI. Encíclica Mortalium Animos. 1928.
São Roberto Belarmino. De Romano Pontifice.
Concílio de Trento. Sessão XXII (sobre o Santo Sacrifício da Missa).
Anthony Cekada, Work of Human Hands (2010).