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Martinho Lutero foi influenciado pelo nominalismo, humanismo renascentista, esoterismo e misticismo alemão




Martinho Lutero, embora seja mais conhecido por sua ruptura com a Igreja Católica e pelo início da Reforma Protestante, foi influenciado por algumas das correntes de pensamento que circulavam no Renascimento, embora de maneira seletiva e crítica. Embora Lutero se opusesse a muitos aspectos do esoterismo e do misticismo renascentistas, ele absorveu e reinterpretou certos elementos humanistas que se alinharam com suas preocupações teológicas e pastorais.

Nominalismo de Guilherme de Ockham

Martinho Lutero foi influenciado pelo nominalismo de Ockham. O nominalismo, ao enfatizar a separação entre fé e razão e ao rejeitar a ideia de universais metafísicos, questionava a capacidade da razão humana de compreender a realidade divina por completo. Essa visão atraiu Lutero, que defendia uma relação direta e pessoal com Deus, sem mediações racionais excessivas. Para ele, a salvação era uma questão de fé pura e não de entendimentos filosóficos complexos. Essa influência nominalista contribuiu para seu afastamento das doutrinas escolásticas dominantes e para a ênfase em uma teologia baseada na Bíblia e na graça divina.

Outro nominalista que influenciou Lutero foi Duns Escoto. Diferentemente de outros pensadores medievais, defendeu que a vontade tem primazia sobre o intelecto, que valorizava a vontade humana e a fé acima das abstrações racionais. João Duns Escoto (1266–1308), conhecido como "Doutor Sutil", foi um dos filósofos e teólogos mais influentes da Idade Média. Escoto, como seu contemporâneo Guilherme de Ockham, é associado ao nominalismo, mas suas ideias são, na verdade, mais complexas e equilibradas, entre o realismo tomista e o nominalismo radical. Ele desenvolveu uma filosofia metafísica e teológica que enfatizava a unicidade e a individualidade dos seres, introduzindo o conceito de "haecceitas" (ou "isto-idade"), a qualidade que confere a cada ser sua singularidade. Além disso, Escoto foi um dos primeiros a defender de maneira explícita a Imaculada Conceição de Maria, um tema importante na teologia católica. Sua obra complexa desafiou e ampliou o pensamento medieval, impactando teólogos e filósofos nos séculos seguintes.

Influência do humanismo renascentista

Lutero reinterpretou o conceito renascentista de dignidade humana, colocando-o em um contexto teológico centrado na dependência de Deus. Enquanto o humanismo renascentista promovia a elevação e o potencial do ser humano como agente autônomo, Lutero acreditava que a verdadeira dignidade humana vinha da graça divina e do reconhecimento da própria limitação e necessidade de Deus.

O humanismo renascentista tinha seu foco na autonomia e na interpretação direta dos textos antigos. Ele foi fortemente impactado pelo estudioso humanista Erasmo de Rotterdam, que defendia o retorno às fontes originais dos textos bíblicos e incentivava a tradução das Escrituras para o vernáculo. Essa ideia inspirou Lutero a traduzir a Bíblia para o alemão, buscando tornar as Escrituras acessíveis a todos os cristãos e possibilitar que eles interpretassem a Palavra de Deus de maneira direta, sem a mediação exclusiva da Igreja.

Próximo do esoterismo, e afinidade com o misticismo alemão

Embora Lutero fosse bastante crítico em relação ao esoterismo e à filosofia hermética, ele possuía uma afinidade com o misticismo alemão, especialmente com as obras de Johannes Tauler e a "Teologia Alemã" (um texto anônimo influenciado pelo misticismo medieval). Esse misticismo enfatizava a experiência direta e pessoal de Deus, uma ideia que ressoava com o conceito de Lutero de "sacerdócio universal dos crentes", onde cada indivíduo tem acesso a Deus sem a necessidade de um intermediário.

Diferente de pensadores renascentistas como Marsilio Ficino e Pico della Mirandola, que abraçavam a cabala e a alquimia como meios de explorar o divino e o natural, Lutero via essas práticas com desconfiança. Ele as considerava incompatíveis com o cristianismo e o estudo da Bíblia. Lutero estava mais focado na pureza das Escrituras e na fé direta em Deus do que na busca de um conhecimento oculto, que ele considerava desnecessário e potencialmente perigoso para a verdadeira fé.

Mas Lutero teve alguma exposição ao esoterismo desde a infância, pois seu pai, Hans Lutero, acreditava profundamente em presságios, astrologia e nas forças espirituais. Esse contexto cultural certamente permeou a vida de Lutero e pode ter influenciado seu modo de entender a relação entre o divino e o material. O ambiente medieval onde ele cresceu era repleto de crenças esotéricas, mágicas e místicas que eram parte da vida cotidiana.

Porém, quando adulto e teólogo, Lutero adotou uma postura bastante cautelosa, até crítica, em relação a esses temas. Ele rejeitava abertamente muitas práticas esotéricas que, para ele, poderiam afastar o cristão da fé direta em Deus e levá-lo a confiar em "superstições" em vez de na fé genuína. Ainda assim, mesmo sendo crítico, Lutero mantinha certa curiosidade em relação à astrologia e acreditava em fenômenos espirituais, como a presença de demônios, o que mostra que ele não rompeu completamente com todas as práticas esotéricas.

Autonomia espiritual e reforma da Igreja

A ideia renascentista de autonomia espiritual, que estava presente nos círculos esotéricos e humanistas, inspirou Lutero a questionar a autoridade da Igreja Católica e a colocar a fé individual em um lugar central. Embora Lutero não tivesse como objetivo promover uma revolução cultural como o Renascimento, ele buscava uma reforma espiritual, onde o relacionamento com Deus fosse direto, baseado na fé e não em ritos ou dogmas intermediados pela Igreja.

Enfim, podemos dizer que Lutero bebeu das fontes renascentistas, especialmente do humanismo, mas nnão descartou parte do esoterismo e do misticismo mágico que caracterizou outros pensadores da época.

Nominalismo de Guilherme de Ockham e sua influência no misticismo alemão


Guilherme de Ockham (ou Occam) é frequentemente lembrado pela “Navalha de Ockham”, princípio lógico de economia explicativa, mas ele também exerceu uma grande influência no pensamento místico e espiritual da Idade Média, especialmente no misticismo alemão. Embora ele não seja exatamente considerado um místico, sua filosofia ajudou a moldar os entendimentos de indivíduos como Mestre Eckhart, Johannes Tauler e Heinrich Seuse, principais expoentes do misticismo alemão medieval.

Ockham defendia o conceito de via negativa (ou apofática), que sugere que Deus está além da compreensão e da descrição humanas. Esse pensamento influenciou o misticismo alemão ao reforçar a ideia de que a experiência direta e pessoal de Deus transcende a lógica e o entendimento humanos. Assim, o misticismo alemão passou a enfatizar uma experiência de Deus baseada na união mística, onde o indivíduo se esvazia para se abrir a uma comunicação direta e interiorizada com o divino.

Individualismo e o Conhecimento Divino

Ockham também foi importante na formação de um pensamento mais individualista sobre a fé, defendendo que a relação com Deus não dependia da Igreja, mas sim de um contato pessoal. Essa ideia inspirou místicos alemães a explorar a "centelha divina" dentro de si, sem a mediação de instituições eclesiásticas. 

Essa busca de uma espiritualidade mais íntima e direta, que surge da influência de Ockham, seria posteriormente uma base teológica que abriria caminho para o desenvolvimento da Reforma Protestante.