A ideia central de Balthasar pode ser resumida assim: embora não possamos afirmar que todos se salvarão (o que seria heresia), podemos “ousar esperar” que talvez sim. Essa esperança, segundo ele, estaria em harmonia com a misericórdia de Deus e com a redenção universal operada por Cristo. No entanto, essa esperança repousa não na revelação divina, mas num sentimentalismo especulativo. A condenação eterna não é hipótese retórica nos Evangelhos, mas verdade reiterada (Lc 16,23; Mt 25,46). Cristo fala repetidamente do fogo inextinguível, da separação dos bodes e das virgens néscias. Esperar que ninguém vá para o inferno é esperar que essas palavras não se cumpram. Como afirma Ralph Martin, "Balthasar transforma as advertências de Cristo em teatrinho pedagógico: elas serviriam apenas para assustar, mas não descrevem algo que de fato acontecerá" (Martin 2012, p. 174).
A grande fraude de Balthasar é revestir de “esperança cristã” aquilo que é, em verdade, negação da justiça divina. Michael McClymond chama isso de "universalismo implícito": uma doutrina que evita a palavra, mas sustenta seu conteúdo (McClymond 2018, vol. II, p. 1032). Essa fuga tem nome: covardia. O inferno é doutrina revelada. Recusá-lo é recusar Cristo. Balthasar tenta se esquivar alegando que não afirma, apenas espera. Mas isso é um artifício lógico indigno de um teólogo católico. Aidan Nichols reconhece que, ao eliminar o elemento do juízo divino real e iminente, a pregação perde seu caráter urgente: “A esperança de salvação universal, mesmo que não seja certeza, acaba por esvaziar a exortação à penitência” (Nichols 2006, p. 112).
Desde os Padres até os catecismos, o ensinamento constante da Igreja nunca sustentou esperança universalista. Santo Agostinho, São Tomás de Aquino, São João Crisóstomo e o próprio Catecismo Romano ensinam que muitos se perdem. Bento XII definiu infalivelmente que as almas dos condenados “descem imediatamente ao inferno” (DS 1002). O universalismo disfarçado de Balthasar é estranho a essa tradição. Ele se afasta do realismo escatológico que leva as almas à conversão, e introduz um anestésico espiritual que nada tem de apostólico.
A tese de Balthasar é, na melhor das hipóteses, uma ilusão piedosa. Na pior – e mais provável – uma heresia refinada. Esperar que todos se salvem, apesar do claro ensinamento de Nosso Senhor, é um ato de desobediência intelectual. Não se trata de esperança, mas de fuga. Como bem observa Garrigou-Lagrange, “é um erro grave pensar que a misericórdia divina contradiz sua justiça” (Garrigou-Lagrange, La Vie Éternelle, 1950). Balthasar, incapaz de suportar o escândalo do inferno, preferiu imaginar uma salvação total. Mas entre a doutrina da Igreja e os delírios de teólogos do século XX, não há lugar para conciliação. Ousar esperar? Sim. Mas ousar esperar que Jesus estivesse blefando? Isso, não.
Referências
Balthasar, H. U. von (1986). Was dürfen wir hoffen?. Einsiedeln: Johannes Verlag.
Garrigou-Lagrange, R. (1950). La Vie Éternelle et la profondeur de l’âme. Paris: Desclée.
Martin, R. (2012). Will Many Be Saved?. Grand Rapids: Eerdmans.
McClymond, M. (2018). The Devil’s Redemption: A New History and Interpretation of Christian Universalism, 2 vols. Grand Rapids: Baker Academic.
Nichols, A. (2006). Balthasar for Thomists. San Francisco: Ignatius Press.
Balthasar, H. U. von (1986). Was dürfen wir hoffen?. Einsiedeln: Johannes Verlag.
Garrigou-Lagrange, R. (1950). La Vie Éternelle et la profondeur de l’âme. Paris: Desclée.
Martin, R. (2012). Will Many Be Saved?. Grand Rapids: Eerdmans.
McClymond, M. (2018). The Devil’s Redemption: A New History and Interpretation of Christian Universalism, 2 vols. Grand Rapids: Baker Academic.
Nichols, A. (2006). Balthasar for Thomists. San Francisco: Ignatius Press.