A "Doutora da Igreja": Uma Ruptura com a Tradição


Argumenta-se que a nomeação de mulheres ao título de Doutoras da Igreja representa uma inovação pós-conciliar em conflito direto com a Tradição apostólica. Os argumentos centrais, baseados em fontes escriturísticas (notavelmente 1 Tm 2,12 e 1 Cor 14,34) e na teologia de São Tomás de Aquino, defendem que o título de "Doutor" implica uma autoridade de ensino pública e magisterial (auctoritas docendi publica), um ofício que a Tradição constante da Igreja reservou exclusivamente aos varões. A tese sustenta que tal inovação não é um desenvolvimento doutrinário legítimo, mas uma ruptura motivada por uma concessão a ideologias seculares modernas, como o feminismo e o igualitarismo, confundindo o testemunho privado de santidade, que é acessível a todos, com o magistério público e oficial.

🔗Ruptura Fabricada vs. Desenvolvimento Orgânico
A questão central levantada pela tese não é a santidade ou a profundidade dos escritos de certas mulheres, mas a natureza da própria Tradição. Um princípio fundamental da teologia católica é que a doutrina e a liturgia se desenvolvem organicamente ao longo dos séculos, como uma semente que cresce numa árvore, mantendo sempre a sua identidade essencial. Contudo, as reformas que se seguiram ao Concílio Vaticano II introduziram frequentemente mudanças que não representam um crescimento, mas uma fabricação artificial, uma "ruptura com a tradição" (Cekada, 2010, p. 471).

O mesmo padrão identificado na criação da Missa Nova pode ser observado aqui. A reforma litúrgica não aprimorou o rito existente, mas o substituiu por algo fundamentalmente diferente, concebido por comissões e influenciado por um antiquarianismo espúrio e pressões ecumênicas (Cekada, 2010, p. 473). De modo análogo, a criação de "Doutoras da Igreja" não é a evolução de um conceito preexistente, mas a imposição de uma categoria nova que contradiz o ensinamento apostólico sobre os papéis distintos na Igreja. Trata-se de uma construção que reflete mais as prioridades de uma era do que a continuidade da fé apostólica.

🌐A Acomodação a Ideologias Modernas
A análise da reforma litúrgica demonstra como as mudanças foram justificadas por uma necessidade de se adaptar ao "homem moderno". Orações foram reescritas para eliminar a "teologia negativa" e conceitos considerados desagradáveis à mentalidade contemporânea, como a ira de Deus, o desapego do mundo e os méritos dos santos (Cekada, 2010, p. 283-303). O objetivo era tornar a fé mais palatável e ecumenicamente aceitável.

A tese em discussão sugere um processo idêntico. A pressão para nomear Doutoras da Igreja surge não de uma necessidade teológica interna, mas de uma pressão externa para se conformar com o igualitarismo secular. É uma concessão ao feminismo moderno, que vê as distinções hierárquicas e de papéis como uma injustiça a ser corrigida. Assim como a liturgia foi remodelada para refletir uma "imagem de uma assembleia reunida" em vez do Sacrifício do Calvário (Cekada, 2010, p. 209), a estrutura do magistério eclesial é implicitamente alterada para satisfazer uma noção mundana de igualdade, minando a ordem divinamente estabelecida.

🏛️A Erosão da Ordem Sacra e da Hierarquia
Um dos efeitos mais devastadores da nova liturgia foi a erosão do sentido do sagrado e da distinção hierárquica entre o sacerdote e o leigo. O sacerdote, antes um alter Christus oferecendo um sacrifício a Deus em nome do povo, foi transformado no "presidente da assembleia" (Cekada, 2010, p. 157). A arquitetura, as rubricas e as orações foram todas modificadas para enfatizar a comunidade em detrimento da ação sacrificial e hierárquica.

A introdução de Doutoras da Igreja participa dessa mesma lógica de horizontalização. Ela obscurece a distinção fundamental entre a função docente pública, ligada ao sacerdócio e à hierarquia masculina, e a contribuição privada, ainda que imensamente valiosa, de todos os fiéis. Ao conceder um título historicamente associado ao ensino público e oficial a quem, por ordem divina, não pode exercer tal função, cria-se uma ambiguidade que mina a clareza da estrutura hierárquica da Igreja, estabelecida por Cristo.

⚖️Conclusão
Analisada através da mesma lente crítica aplicada à reforma litúrgica, a tese de que a nomeação de Doutoras da Igreja constitui uma ruptura com a Tradição se mostra teologicamente coerente. Não se trata de uma questão de mérito pessoal, mas de fidelidade aos princípios imutáveis da fé. Assim como a Missa de Paulo VI é descrita como uma "obra de mãos humanas" que reflete as ideologias de seus criadores, esta inovação parece ser menos um ato do Espírito Santo guiando a Igreja em continuidade e mais uma resposta a pressões seculares, resultando em uma deformação da ordem e do ensinamento tradicionais.

📚Referências
Cekada, A. (2010). Obra de Mãos Humanas: Uma crítica teológica à Missa de Paulo VI. Philothea Press.