✝️ Em De la Cábala al Progresismo (1962), Padre Julio Meinvielle, sacerdote e intelectual argentino, propõe uma genealogia ideológica que explica como princípios alheios à Revelação cristã penetraram lentamente na Igreja, deformando não apenas a reflexão teológica, mas também a própria ação pastoral. O núcleo do problema, segundo o autor, é o naturalismo — a visão que reduz a vida humana e social a princípios puramente terrenos, excluindo na prática a ordem sobrenatural da graça.
📜 A narrativa de Meinvielle começa com a Cábala judaica e com vertentes gnósticas antigas e medievais. Para ele, esses sistemas esotéricos introduzem um panteísmo disfarçado e uma leitura imanentista da história, em que a salvação deixa de ser um dom sobrenatural concedido por Deus e passa a ser concebida como um processo interno ao mundo, de caráter coletivo e histórico. Essa mudança de foco — do transcendente para o imanente — é o germe de todas as transformações posteriores.
💡 No período moderno, essas ideias encontram expressão filosófica no racionalismo e no iluminismo. O cartesianismo inaugura uma confiança absoluta na razão como critério supremo de verdade, e o deísmo reduz Deus a um legislador distante, sem intervenção na vida do homem. Pensadores como Voltaire, Rousseau e os enciclopedistas radicalizam o processo, estabelecendo que a moralidade e a organização social podem e devem ser construídas sem referência à graça ou à autoridade divina.
🇫🇷 A Revolução Francesa (1789) marca, para Meinvielle, a passagem do plano filosófico para o plano político. Seus lemas — liberdade, igualdade e fraternidade — tornam-se, na prática, absolutos terrenos que se pretendem universais, desligados de qualquer fundamento sobrenatural. A maçonaria, segundo o autor, age como principal veículo de difusão desses ideais, funcionando como um sistema paralelo de valores e objetivos que busca remodelar toda a sociedade e, em última instância, a própria religião.
⛪ A etapa seguinte, e mais preocupante, é a penetração dessas ideias dentro da própria Igreja. Esse fenômeno assume a forma do progressismo católico, no qual se procura reinterpretar a missão e a pastoral em termos compatíveis com o espírito do mundo moderno. O resultado é uma inversão de prioridades: a meta central — a salvação eterna das almas — cede espaço a objetivos predominantemente temporais, como a melhoria das condições sociais, a promoção de uma fraternidade universal de base humanitária e o engajamento em causas políticas. Embora o vocabulário e a simbologia cristã sejam preservados, o conteúdo é gradualmente adaptado a um horizonte imanentista.
⛓️ Meinvielle descreve o mecanismo dessa infiltração em três movimentos encadeados. Primeiro, ocorre a inversão teológica, em que categorias sobrenaturais como pecado, graça e redenção cedem lugar à centralidade de problemas sociopolíticos e econômicos. Depois, vem a diluição doutrinal, que relativiza verdades dogmáticas sob o pretexto de diálogo e abertura ao mundo moderno. Por fim, instala-se a pastoral horizontalista, planejada segundo métodos e objetivos de inspiração sociológica, onde a evangelização é confundida com programas de reforma social.
⚠️ As consequências dessa transformação são graves: enfraquecimento da dimensão sobrenatural da vida cristã, relativização do dogma, ecumenismo indiferentista e assimilação de categorias seculares para pensar a missão da Igreja. O resultado final, adverte o autor, é uma religião formalmente cristã, mas materialmente conformada aos princípios do naturalismo.
🛡️ Como remédio, Meinvielle propõe três linhas de ação: retorno à teologia tomista, capaz de integrar razão e Revelação sem reduções; reafirmação da centralidade da graça e dos sacramentos como meios indispensáveis de salvação; e resistência intelectual e pastoral a todas as formas camufladas de naturalismo, ainda que travestidas de atualização pastoral ou de serviço ao homem.
⚔️ Assim, De la Cábala al Progresismo não é apenas um estudo histórico, mas também um manifesto de combate. Sua força está em mostrar que o progressismo católico não é uma novidade isolada do século XX, mas o estágio final de um processo multissecular de infiltração ideológica, que só pode ser revertido pela recuperação plena do sentido sobrenatural da fé e da missão da Igreja.