Barron diz que podemos ter esperança de que ninguém esteja no inferno. Vamos recapitular, só para ter certeza de que não estamos ouvindo eco de Hans Urs von Balthasar em alta rotação: segundo Barron, embora o inferno seja “possível”, é de bom tom não supor que ninguém de fato o habite. Nem Judas Iscariotes. Nem Hitler. Nem, talvez, os clérigos que abusam da fé alheia sob aparência de caridade. Ora, isso não é esperança. Isso é negação revestida de nefelibatismo teológico. Uma “esperança” que contradiz frontalmente Nosso Senhor, que falou mais vezes do inferno do que do céu (Mt 7,13; Mt 25,41; Mc 9,43 etc.).
Barron convoca Aristóteles como se invocasse um fantasma gentil que apoiasse sua tese. Mas ignora por completo o realismo moral do Estagirita e seu entendimento de que as ações livres têm consequências reais. A teleologia aristotélica não admite esse tipo de “esperança sem conteúdo”. E quanto a Santo Tomás de Aquino, que jamais hesitou em afirmar a realidade de almas condenadas, e cuja teologia do inferno está entre as mais robustas da tradição da Igreja? Como sempre no Novus Ordo, ele é citado quando serve, e esquecido quando incomoda.
A parte mais exasperante — e aqui o autor do artigo acerta o alvo — é o uso do rótulo “hermenêutica da continuidade” para justificar tudo, inclusive a mais descarada ruptura. “Veja, estamos apenas desenvolvendo a doutrina...” Claro, e agora o inferno é um conceito fluido, pastoralmente problemático, e talvez uma metáfora psicológica. Isso não é continuidade. Isso é a amputação do dogma com anestesia modernista.
O dogma da existência do inferno não é uma invenção medieval, nem um acidente da cristandade obscurantista. É parte integrante do Depósito da Fé. Negá-lo, relativizá-lo ou “esperançá-lo” fora de existência é não só erro, mas heresia formal, como ensinou São Roberto Belarmino e reafirmou o Magistério pré-Vaticano II.
Dom Barron precisa de uma boa leitura do Catecismo do Concílio de Trento, não do Catecismo Light com Animações Digitais que se tornou moda nas últimas décadas.
Referências
Catholic Family News. “Beyond Barron: Aristotle, Hell, and the Hermeneutic of Continuity”. 4 de junho de 2025. https://catholicfamilynews.com/blog/2025/06/04/beyond-barron-aristotle-hell-and-the-hermeneutic-of-continuity
Santo Tomás de Aquino. Suma Teológica, Suplemento, q. 98–99.
Catecismo do Concílio de Trento, Parte I, artigo V – “Descensus ad Inferos”.
São Roberto Belarmino, De Aeternis Suppliciis Damnatorum.
Pe. Anthony Cekada. Work of Human Hands: A Theological Critique of the Mass of Paul VI. Philothea Press, 2010.