A chegada de Mgr Touvet como bispo coadjutor à diocese de Fréjus-Toulon em 2023 marcou o início de uma série de restrições litúrgicas que abalaram a estrutura diocesana. O episódio mais emblemático ocorreu quando, apenas cinco dias antes de sua ordenação, o futuro diácono Thomas Duchesne foi confrontado com um documento que alteraria significativamente sua prática religiosa.
O documento, apresentado na paróquia de São Pio X em Toulon, estabelecia uma série de limitações que atingiam o coração da prática litúrgica tradicional. Duchesne deveria comprometer-se a celebrar exclusivamente segundo o missal de Paulo VI, abandonando elementos do rito antigo. A administração dos sacramentos ficaria restrita ao rito reformado, e a Liturgia das Horas deveria seguir apenas o formato atual.
Mas as restrições não pararam por aí. Os celebrantes foram proibidos de incorporar elementos tradicionais à liturgia conciliar - nada de sinais da cruz adicionais, genuflexões extras ou recitação silenciosa do Cânon. Até mesmo a distribuição da comunhão sofreu alterações, com a proibição de recusar dar a hóstia na mão dos fiéis.
A onda de mudanças atingiu também os novos párocos da diocese. Através de cartas de nomeação no início do ano letivo, foram instruídos a não celebrar "de costas para o povo", abandonar o Ofertório da Missa Tridentina e evitar o uso exclusivo da Oração Eucarística I no Novus Ordo.
Os Missionários da Divina Misericórdia enfrentaram seu próprio conjunto de restrições. Embora Touvet tenha permitido ordenações em missa tradicional, exigiu que seguissem o novo rito de ordenação - uma combinação peculiar, considerando que a reforma litúrgica havia abolido as ordens menores e o subdiaconato. Mais controverso ainda foi impedir que os novos padres celebrassem a missa tradicional após suas ordenações, contrariando as próprias constituições de sua ordem.
A tentativa de estender estas exigências a nove futuros diáconos resultou em resistência significativa. Confrontado com a reação negativa, que denunciava claramente um abuso de poder, Touvet foi forçado a recuar, levando consigo as cópias do documento e prometendo "retrabalhar" o assunto.
O mais irônico nesta situação é que, como bispo coadjutor, Mgr Touvet não possui autoridade canônica para impor tais restrições litúrgicas. Suas ações não apenas ultrapassaram seus limites jurisdicionais, mas também ignoraram a rica história de acolhimento à tradição que caracterizava a diocese desde os tempos de Mgr Madec. Em apenas um ano, suas políticas restritivas conseguiram alienar grande parte do clero diocesano, levantando sérias questões sobre o futuro da unidade pastoral em Fréjus-Toulon.
A História por Trás da Chegada de Mgr Touvet a Fréjus-Toulon
A nomeação de Monsenhor Dominique Touvet como bispo coadjutor de Fréjus-Toulon em 2023 não foi um acontecimento isolado, mas parte de uma estratégia mais ampla do Vaticano para realinhar uma das dioceses mais singulares da França. Com uma sólida formação que inclui estudos no Seminário Francês em Roma e um doutorado em Direito Canônico, Touvet chegou a Fréjus-Toulon após um período significativo como bispo de Châlons-en-Champagne, onde serviu desde 2015 sob nomeação do Papa Francisco.
O contexto de sua transferência é particularmente revelador. Em 2022, uma decisão extraordinária do Vaticano havia suspendido todas as ordenações na diocese de Fréjus-Toulon, então sob a liderança de Mgr Rey. Esta intervenção refletia preocupações profundas de Roma sobre os métodos de formação dos seminaristas locais. A diocese havia se tornado conhecida por sua abertura incomum a diferentes sensibilidades litúrgicas, incluindo as mais tradicionalistas - uma característica que, aparentemente, já não encontrava tanto respaldo nas diretrizes atuais do Vaticano.
A escolha de Touvet para esta missão não parece ter sido aleatória. Seu perfil, fortemente alinhado com as políticas do Papa Francisco, sugere uma tentativa deliberada de implementar as diretrizes do "Traditionis Custodes", documento papal que estabelece restrições significativas à celebração da missa tradicional. Sua experiência em administração diocesana e profundo conhecimento do direito canônico o qualificavam tecnicamente para a delicada tarefa de reorganizar uma diocese que Roma considerava precisar de ajustes.
Esta trajetória prévia de Touvet ajuda a compreender suas ações recentes em Fréjus-Toulon. Suas medidas restritivas em relação às práticas litúrgicas tradicionais, que têm gerado considerável tensão local, parecem ser menos uma iniciativa pessoal e mais a implementação de uma política alinhada com as diretrizes atuais do Vaticano. Sua nomeação representa, assim, um momento de transição significativa para uma diocese que, por décadas, havia se destacado por sua abordagem mais plural às diferentes expressões da liturgia católica.
O contraste entre o histórico de abertura da diocese e a nova direção imposta por Touvet ilustra um embate mais amplo dentro da Igreja Católica contemporânea: a tensão entre a preservação de práticas tradicionais e o impulso por uma maior uniformidade litúrgica sob as diretrizes atuais de Roma. Neste contexto, Touvet emerge não apenas como um administrador diocesano, mas como um agente de mudança alinhado com uma visão específica da Igreja Católica no século XXI.
Os bispos
Monsenhor Dominique Touvet é o atual bispo coadjutor da diocese de Fréjus-Toulon, nomeado em 2023. Ele sucederá Monsenhor Dominique Rey, que exerce o cargo de bispo titular dessa diocese desde o ano 2000. Antes de Rey, Monsenhor Joseph Louis Marie Madec (1923-2013) foi bispo de Fréjus-Toulon, de 1983 a 2000, sendo reconhecido por fundar o seminário de Castille e por iniciar a política de abertura aos tradicionalistas.
Fonte (1)