Introito
Sl. 69:2-3 Ó Deus, vem em meu auxílio; ó Senhor, apressa-te em me socorrer. Sejam confundidos e envergonhados os meus inimigos que buscam a minha vida. Sl. 69:4. Que aqueles que desejam a minha ruína sejam repelidos em desgraça.
Jeremias 17,5-10
Assim diz o Senhor: Maldito o homem que confia no homem, e põe a carne por seu braço, e cujo coração se aparta do Senhor. Porque será como o tamariz no deserto, e não verá quando vier o bem; mas habitará nos lugares secos do deserto, em terra salgada e inabitável. Bendito o homem que confia no Senhor, e cuja esperança é o Senhor. Porque será como a árvore plantada junto às águas, que junto à corrente lança suas raízes, e não temerá quando vier o calor, e a sua folha será verde; e no tempo da seca não ficará ansiosa, nem deixará de dar fruto. Mais enganoso é o coração que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá? Eu, o Senhor, que esquadrinho o coração e provo os rins, e isso para dar a cada um segundo o seu caminho e segundo o fruto das suas obras.
Lucas 16,19-31
Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e todos os dias se banqueteava esplendidamente. Havia também um pobre, chamado Lázaro, que estava deitado à sua porta, coberto de chagas, e desejando fartar-se das migalhas que caíam da mesa do rico; mas ninguém lhas dava, e os cães vinham lamber-lhe as chagas. Sucedeu, pois, que morreu o pobre, e foi levado pelos anjos ao seio de Abraão; morreu também o rico, e foi sepultado. E no inferno, estando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio. E exclamando disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e envia-me Lázaro, para que molhe a ponta do dedo em água e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse-lhe Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro, ao contrário, os males; e agora este é consolado, e tu atormentado. E além de tudo isso, entre nós e vós está posto um grande abismo, de sorte que os que querem passar daqui para vós não podem, nem de lá vir para cá. Disse ele então: Rogo-te, pois, pai, que o envies à casa de meu pai, porque tenho cinco irmãos, para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormentos. Respondeu-lhe Abraão: Eles têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. Disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum dos mortos for ter com eles, farão penitência. Respondeu-lhe: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tão-pouco crerão ainda que algum dos mortos ressuscite.
Homilias
Santo Agostinho, "Sermões sobre as Escrituras" (Sermo 36) - A parábola revela a justiça divina que inverte as condições terrenas: os prazeres efêmeros do rico tornam-se tormentos eternos, enquanto os sofrimentos do pobre são trocados por consolações perpétuas. Não é a riqueza em si que condena, nem a pobreza que salva, mas o uso que se faz dos bens e a disposição do coração diante de Deus. O abismo intransponível simboliza a irreversibilidade do julgamento após a morte, mostrando que as escolhas da vida determinam o destino eterno, sem possibilidade de mudança póstuma. A recusa de Abraão em enviar Lázaro aos irmãos do rico sublinha que a revelação divina, dada por Moisés e os Profetas, é suficiente para a conversão; milagres extraordinários não substituem a fé obediente à Palavra. A incredulidade persiste mesmo diante de prodígios, pois o coração endurecido rejeita a verdade, preferindo as ilusões do mundo. Assim, a parábola exorta à caridade, à escuta da Escritura e à vigilância, pois o tempo de misericórdia é agora, na vida presente.
São Tomás de Aquino, "Suma Teológica" (II-II, q. 32, a. 5, sobre a esmola; e III, q. 66, a. 8, sobre o estado após a morte) - A narrativa apresenta a necessidade da esmola como ato de justiça e caridade, pois o rico, ao ignorar Lázaro, falhou em partilhar seus bens supérfluos, incorrendo em pecado de omissão. A posse de riquezas não é ilícita, mas o apego a elas e a indiferença aos necessitados conduzem à danação. O tormento do rico no inferno manifesta a pena devida ao pecado, enquanto a consolação de Lázaro no seio de Abraão reflete a recompensa da paciência nas tribulações, ordenada por Deus para a purificação da alma. O abismo fixado entre os dois estados demonstra a imutabilidade do juízo divino após a morte, pois a alma, separada do corpo, recebe imediatamente sua retribuição, sem possibilidade de mérito ou demérito adicionais. A súplica do rico pelos irmãos revela a inutilidade de sinais extraordinários quando falta a disposição interior para acolher a lei divina, que já é clara na Escritura. Assim, a parábola ensina que a caridade ativa e a fé na revelação são os caminhos para evitar o castigo eterno.
Hugo de São Vítor, "De Sacramentis Christianae Fidei" (Livro II, Parte XIV, sobre a escatologia) - A história ilustra o contraste entre a vida temporal e a eternidade, onde os bens terrenos, simbolizados pelas vestes de púrpura do rico, são vãos diante da glória celestial concedida ao pobre. O seio de Abraão representa o repouso das almas justas, um estado de beatitude que prefigura a visão de Deus, enquanto o inferno do rico é o lugar de separação definitiva da divina presença. O abismo estabelecido não é apenas físico, mas moral, resultado das escolhas livres que fixam o destino da alma, mostrando que a misericórdia divina opera na terra, mas a justiça prevalece após a morte. A recusa de enviar Lázaro aos vivos enfatiza que a Escritura, como luz divina, basta para orientar à salvação; a dureza de coração, e não a falta de sinais, é a causa da perdição. A parábola chama à contemplação das realidades invisíveis, à prática das virtudes e ao desapego dos prazeres mundanos, preparando a alma para o juízo final.