28 mar - SEXTA-FEIRA DA 3ª SEMANA DA QUARESMA

Féria de 3ª Classe – Missa Própria, com comemoração de S. João Capistrano, Confessor

São João de Capistrano
(24 de junho de 1386 – 23 de outubro de 1456) foi um frade franciscano italiano, conhecido por sua vida de intensa espiritualidade e feitos notáveis. Nascido em Capestrano, Abruzzo, ele inicialmente seguiu a carreira jurídica, tornando-se governador de Perúgia, mas, após ser preso durante um conflito político, experimentou uma conversão profunda na prisão, inspirado por São Francisco de Assis. Abandonou sua vida secular, ingressou na Ordem Franciscana em 1416 e dedicou-se à pregação, à reforma da ordem e à defesa da fé cristã. Um de seus maiores feitos foi liderar, aos 70 anos, uma cruzada em 1456 contra os turcos otomanos, contribuindo decisivamente para a vitória na Batalha de Belgrado, que freou a expansão islâmica na Europa. Sua vida espiritual foi marcada por austeridade, devoção ao Nome de Jesus e um ardente zelo apostólico. Uma obra significativa associada a São João de Capistrano é o "Speculum Conscientiae" (Espelho da Consciência), um tratado moral e teológico que reflete sua preocupação com a ortodoxia e a reforma espiritual. Um texto representativo de seu espírito pode ser extraído de suas pregações, como: “Invocai o nome de Jesus. Só nele há salvação!”.

PRÓPRIO DO DIA

Introito (Sl 85, 17| ib., 1)
Fac mecum, Dómine, signum in bonum... Fazei brilhar em mim, Senhor, um sinal de vossa bondade, para que o vejam os que me odeiam e sejam confundidos: pois Vós, Senhor, sois o meu auxílio e a minha consolação. Sl. Inclinai, Senhor, o vosso ouvido, e escutai-me, porque sou um desvalido e um pobre.

Epístola (Num. 20, 1-3 e 6-13)
Livro dos Números. Naqueles dias, reuniram-se os filhos de Israel contra Moisés e Aarão, e preparando uma revolta, disseram: Dai-nos água para bebermos. Saíram Moisés e Aarão do meio do povo, entraram no tabernáculo da aliança e lançando-se por terra, clamaram ao Senhor e Lhe disseram: Senhor Deus, ouvi o clamor deste povo e abri-lhe o vosso tesouro, a fonte de água viva, para saciá-lo, deixando ele de murmurar. E manifestou-se sobre eles a glória de Deus. E o Senhor falou a Moisés, dizendo: Toma a vara e reúne o povo, tu e Aarão, teu irmão, e fala à pedra, perante eles; e ela produzirá água. Quando da pedra fizeres sair água, beberá todo o povo e também os seus animais. Tomou pois, Moisés, a vara que estava diante do Senhor, como Ele havia ordenado, e reuniu o povo, diante da pedra, dizendo-lhe: Ouvi, rebeldes e incrédulos. Poderemos porventura fazer brotar água dessa pedra para vós? Moisés elevou então a mão e tendo batido duas vezes na pedra com a vara, dela brotou quantidade tão copiosa de água que todo o povo bebeu, assim como os animais. Disse então o Senhor a Moisés e a Aarão: Porque não acreditastes em mim para me glorificar perante os filhos de Israel, vós não fareis entrar este povo na terra que lhes darei. Esta é a água da contradição, em que os filhos de Israel murmuraram contra o Senhor, e na qual Ele foi santificado perante eles.

Evangelho (Jo 4, 5-42)
Naquele tempo, veio Jesus à cidade da Samaria chamada Sicar, junto ao campo que Jacó havia dado a seu filho José. Ali existia o poço de Jacó. Cansado da caminhada, sentou-se Jesus à borda do poço. Era quase a hora de sexta. Vindo uma mulher de Samaria a buscar água, disse-lhe Jesus: Dá-me de beber. (Seus discípulos tinham ido à cidade para comprar víveres.) Disse-Lhe então a Samaritana: Como Tu, que és judeu, me pedes de beber, a mim, que sou mulher Samaritana? Porque os judeus não se comunicam com os Samaritanos. Jesus lhe respondeu: Se conhecesses o Dom de Deus, e Àquele que te diz: Dá-me de beber, talvez tu Lhe fizesses este mesmo pedido e Ele te daria a água viva [corrente]. Respondeu-Lhe a mulher: Senhor, não tens com que tirar água, e fundo é o poço; de onde tens, pois, água viva? És, porventura, maior que o nosso pai Jacó, que nos deu este poço e que também dele bebeu, assim como os seus filhos e os seus rebanhos? Respondeu Jesus e lhe disse: Todo aquele que bebe dessa água terá ainda sede, porém aquele que beber da água que eu lhe der, não mais terá sede, porque a água que eu lhe der, nele transformar-se-á em fonte de água viva, que brotará até a eternidade. Disse-Lhe a mulher: Senhor, dá-me também dessa água a fim de que eu não tenha mais sede e não venha mais aqui para buscá-la. Jesus lhe disse: Vai, chama o teu marido e vem aqui. Respondeu a mulher e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem que não tens marido; porque tiveste cinco e aquele com quem vives não é teu marido, isto é verdade. E a mulher respondeu-Lhe: Senhor, vejo que és um Profeta. Nossos país adoraram nesta montanha, e vós dizeis que Jerusalém é o lugar em que se deve adorar. Disse-lhe Jesus: Mulher, acredita em Mim: aproxima-se a hora em que nem neste monte, nem em Jerusalém, adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. A hora virá, porém, ou já veio, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espirito e em verdade. Taís são os adoradores que o Pai procura. Deus é Espírito; e os que O adoram, em espírito e em verdade O devem adorar. Disse-Lhe a mulher: Sei que o Messias, (que é chamado o Cristo) deve vir. Quando Ele vier, nos anunciará todas as coisas. Disse-lhe Jesus: Sou eu, que te falo. Nesse momento chegaram os seus discípulos e admiraram-se que falasse com uma mulher. Nenhum deles, no entanto, Lhe disse: Que perguntais? ou então: por que falais com ela? Deixando ali a sua ânfora, a mulher partiu para a cidade e disse aos habitantes: Vinde, e vede um homem que me disse tudo quanto eu fiz; não será porventura o Cristo? Saíram eles, pois, da cidade e vieram para junto de Jesus. Seus discípulos, entretanto, O suplicavam, dizendo-Lhe: Mestre, comei. Ele porém, lhes disse: Tenho para comer um alimento que vós não conheceis. Diziam entre si os discípulos: Acaso, ter-Lhe-á alguém trazido alimento ? Jesus lhes disse: Meu alimento é fazer a vontade d’Aquele que me enviou para cumprir a sua obra. Não dizeis: Ainda quatro meses e virá a colheita ? Eis que vos digo: Erguei os vossos olhos e vede os campos que já se tornam maduros para a ceifa. E o que colhe recebe uma recompensa e reúne frutos para a vida eterna, a fim de que o que semeia se alegre tanto quanto o que colhe. Nisto se verifica esta palavra: um é o que semeia, e outro o que colhe. Eu vos enviei a colher onde não trabalhastes; outros trabalharam e vós entrastes nos trabalhos deles. Ora, muitos Samaritanos dessa cidade acreditaram n’Ele, pela palavra da mulher que dava este testemunho: Ele me disse tudo quanto eu fiz. Vindo a Ele, os Samaritanos pediram-Lhe que permanecesse ali. E com eles ficou Jesus dois dias. Em número maior, porém, foram os que acreditaram n’Ele, por suas palavras. E diziam à mulher: Não é mais por causa do que nos disseste que cremos n’Ele; mas porque nós mesmos O ouvimos e sabemos que Ele é, em verdade, o Salvador do mundo.

Homilias

Santo Agostinho (Sermão 104) - A água viva que Cristo oferece é o Espírito Santo, que brota no coração dos fiéis como uma fonte de vida eterna, purificando a alma de todo pecado e inflamando-a com o amor divino. A samaritana representa a Igreja que vem dos gentios, chamada por Cristo para abandonar os falsos cultos e adorar em espírito e verdade, superando as divisões entre judeus e samaritanos. O poço de Jacó simboliza a Lei antiga, que sacia temporariamente, mas não pode dar a plenitude da graça, que só Cristo, o verdadeiro Messias, concede. Os cinco maridos da mulher são as paixões mundanas ou os falsos deuses que ela serviu, enquanto o sexto, que não é seu marido, aponta para a imperfeição da vida carnal que ela ainda leva, até ser plenamente unida a Cristo, o verdadeiro esposo. A colheita de que fala o Senhor é a reunião das almas para a salvação, onde os apóstolos ceifam o que os profetas semearam, mostrando que a obra de Deus transcende o tempo e une todos os povos na fé. A revelação de Cristo como "Eu sou" é a manifestação do Verbo eterno, que se faz conhecer aos humildes e os eleva à comunhão com o Pai.
 
São Tomás de Aquino (Suma Teológica, II-II, q. 2, a. 9 e Comentário a João 4) - A água viva significa a graça divina, que é dada pelo Espírito Santo e conduz à vida eterna, distinta da água material que apenas sacia o corpo temporariamente. A samaritana, ao pedir essa água, mostra um desejo inicial de fé, mas ainda imperfeito, pois busca bens terrenos; Cristo, porém, a eleva ao conhecimento sobrenatural ao revelar sua vida e sua própria identidade como Messias. A adoração em espírito e verdade é o culto interior da alma, que transcende lugares físicos como o monte ou Jerusalém, pois Deus, sendo espírito, é adorado pela caridade e pela fé, não por ritos externos apenas. Os cinco maridos representam os sentidos corporais, que escravizam a alma ao prazer sensível, enquanto o sexto, que não é marido, é a razão corrompida que não a une a Deus; só Cristo, o sétimo, a liberta e a ordena ao fim último. A colheita pronta indica a disposição das almas para receber a graça, preparada pela pregação dos profetas e consumada pela missão dos apóstolos, que participam da obra redentora de Cristo. A comida do Salvador é a obediência ao Pai, mostrando que sua vontade é a salvação universal, que abrange até os samaritanos, outrora excluídos.
 
Santo Ambrósio (Tratado sobre o Evangelho de João) - A água viva é o batismo, que lava os pecados e faz brotar a vida da graça, sendo Cristo a fonte inesgotável que sacia a alma sedenta de justiça. A samaritana simboliza a humanidade caída, que, ao encontrar Cristo, abandona o cântaro das obras mortas e corre para anunciar a salvação aos outros. Os cinco maridos são as eras do mundo ou os falsos ídolos que a alma serviu antes de conhecer o verdadeiro Deus, e o sexto é a instabilidade da vida presente, que não a satisfaz plenamente. A adoração em espírito e verdade é a oferta do coração puro, que não se prende a templos materiais, mas se eleva a Deus pela virtude e pela contemplação. A colheita é a Igreja, que reúne os frutos da pregação apostólica, mostrando que Cristo veio para todos, judeus e gentios, unindo-os num só povo santo. O alimento de Cristo é a cruz, pela qual ele cumpre a vontade do Pai e redime o mundo, chamando todos à fé.

São Bernardo de Claraval – (Sermão sobre a Mulher Samaritana) - A mulher samaritana é a alma humana, afastada de Deus pelo pecado e pela ignorância, mas chamada à conversão pelo Salvador que a encontra em sua miséria. A água viva é o amor divino, que purifica e renova, levando a alma a abandonar os falsos prazeres do mundo, representados pelos cinco maridos, e a buscar a união com o verdadeiro Esposo, que é Cristo. O monte e Jerusalém são figuras das disputas vãs sobre a religião externa, enquanto a adoração em espírito e verdade é o coração contrito que se oferece a Deus como sacrifício vivo. O Filho, ao revelar-se como Messias, mostra que a salvação não é apenas uma promessa futura, mas uma realidade presente na sua pessoa, que convida todos à intimidade com o Pai. A comida do Salvador é o zelo pelas almas, um fogo que consome seu coração e o leva a cumprir a obra da redenção, enquanto os discípulos são chamados a participar dessa chama, ceifando o que Ele semeou com seu sangue.