🎓São João Câncio, nascido na Polônia, foi um sacerdote e professor de teologia na Universidade de Cracóvia que personificou a união entre a fé e as obras. Falecido em 1473, sua vida foi um contínuo exercício de caridade evangélica, despojando-se de seus bens, roupas e até mesmo de seu alimento para socorrer os pobres e necessitados que encontrava em seu caminho. Sua generosidade era tão radical que, certa vez, após ser assaltado, correu atrás dos ladrões não para reaver seus pertences, mas para lhes dar as últimas moedas que havia esquecido de entregar, um gesto que os levou ao arrependimento. Este santo acadêmico não guardou a sabedoria para si, mas a transformou em serviço humilde, vivendo o preceito de que a verdadeira teologia se manifesta no amor ao próximo. Ele compreendeu que a vigilância pedida por Cristo no Evangelho não é uma espera passiva, mas uma prontidão ativa na prática da misericórdia, tornando-se um exemplo vivo da "lei da liberdade" que julga com base no amor praticado.
📜Epístola (Tg 2, 12-17)
Falai e agi [irmãos], como quem deve ser julgado pela lei da liberdade. Pois o juízo é sem misericórdia para o que não teve misericórdia; a misericórdia, porém, triunfa sobre o julgamento. Que adianta a um homem, irmãos meus, dizer que tem fé, se não tem obras? Acaso, pode a fé salvá-lo? Se um irmão ou uma irmã carece de vestimenta, se lhes falta o alimento diário, e um de vós lhes diz: Ide em paz, aquecei-vos e saciai-vos, não lhes dando porém o necessário ao corpo, de que lhes servirá? Assim acontece com a fé; se não for acompanhada de obras, está morta em si mesma.
📖Evangelho (Lc 12, 35-40)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: Estejam cingidos os vossos rins, e em vossas mãos lâmpadas acesas. E sede semelhantes a homens que esperam o seu senhor quando volta das bodas, para que, quando vier e bater à porta, logo a possam abrir. Bem-aventurados aqueles servos, que o Senhor, ao voltar, achar vigilantes. Em verdade vos digo: ele se cingirá e os fará sentar à mesa, e, passando por entre eles, os servirá. E se vier na segunda vigília, ou se vier na terceira e assim os encontrar, bem-aventurados esses servos! Atendei porém a isto: se o pai de família soubesse a hora em que viria o ladrão, com certeza haveria de vigiar e, sem dúvida, não deixaria invadir a sua casa. Assim, estai também vós preparados, porque à hora em que não cuidais, virá o Filho do homem.
🤔Reflexões
✝️A liturgia de hoje nos apresenta uma síntese perfeita da vida cristã através do exemplo de São João Câncio e dos textos sagrados. A Epístola de São Tiago ecoa como um trovão contra uma fé estéril e teórica, afirmando que "a fé, se não for acompanhada de obras, está morta em si mesma". São João Câncio não foi apenas um teólogo que compreendia essa verdade; ele a encarnou. Sua vida foi a exegese viva da "lei da liberdade", a lei do amor que nos liberta do egoísmo para servir a Cristo no próximo. Ele compreendeu que a misericórdia praticada em vida é a única que "triunfa sobre o julgamento". Ao dar seu alimento, suas roupas e seu tempo, ele não fazia apenas filantropia; ele vivia a fé que professava, transformando cada ato de caridade em uma confissão do amor de Deus.
💡O Evangelho de São Lucas, por sua vez, nos exorta à vigilância escatológica. A imagem dos "rins cingidos" e das "lâmpadas acesas" não é um convite ao medo, mas à prontidão amorosa. O servo fiel não espera o seu senhor por temor do castigo, mas por anseio de sua presença. Essa prontidão, contudo, não é uma atitude passiva. As lâmpadas precisam de azeite para arder, e o azeite que alimenta a nossa vigilância são precisamente as obras de misericórdia mencionadas na Epístola. Santo Agostinho ensina que a caridade é o óleo indispensável para as nossas lâmpadas: "O óleo, no bom sentido, é a caridade... Se a caridade se apaga, a lâmpada se extingue" (Santo Agostinho, Sermão 93). Assim, a vigilância do Evangelho é mantida pela caridade ativa da Epístola. São João Câncio manteve sua lâmpada acesa não apenas com orações e estudos, mas com o óleo constante de suas obras de caridade.
👑A interconexão entre fé, obras e vigilância culmina na promessa inaudita do Evangelho: o Senhor que volta "se cingirá e os fará sentar à mesa, e, passando por entre eles, os servirá". Esta inversão de papéis revela a profundidade do amor de Deus e a dignidade a que somos chamados. Não somos meros servos, mas amigos e filhos, aguardados para o banquete celestial. O Catecismo da Igreja Católica nos lembra que no entardecer de nossa vida, seremos julgados pelo amor (CIC, 1022), e esse amor é manifestado nas obras concretas, como as de São João Câncio. Ele viveu cingido para o serviço na terra, preparando-se para o dia em que o próprio Senhor o serviria no Céu. Sua vida nos ensina que a preparação para a vinda do "Filho do homem" não é uma espera ansiosa e vazia, mas um tempo preenchido pela prática diligente do amor que dá vida à fé e nos torna dignos da mesa do Rei.
