O Pacifismo como Fruto do Processo Revolucionário: lema dos não pacíficos e arma psicológica para exterminar os bons


O pacifismo, entendido como a recusa absoluta em reagir à violência e ao assassinato senão por meio da conversa e de regras democráticas, constitui um erro fundamental do Ocidente moderno e um fruto coerente do longo processo revolucionário que há séculos o corrói. Essa concepção parte da ilusão de que toda forma de mal pode ser neutralizada por processos discursivos, esquecendo que a ordem humana se funda, como lembrava Santo Agostinho, na necessidade de reprimir a injustiça. Tal erro não é um desvio isolado, mas uma manifestação da mentalidade revolucionária que, ao negar o pecado original e prometer um paraíso terreno construído pela ciência e pela técnica, torna a existência do mal e, consequentemente, da guerra justa, uma anomalia a ser abolida pelo progresso (Oliveira, 1998, p. 26).

🕊️ A Paz Cristã versus a Paz Revolucionária

Em De Civitate Dei, Agostinho define a paz como tranquilitas ordinis (XIX, 12), isto é, a tranquilidade da ordem (Agostinho, 2006). Essa paz não se confunde com a mera ausência de guerra, mas com a justa ordenação das coisas segundo Deus. Esta é a paz da Civilização Cristã, hierárquica e sacral, na qual a sociedade temporal se espelha na ordem celeste. Quando a ordem é rompida pelo mal objetivo — como o assassinato, a violência ou a agressão injusta — a reação justa não é mera opção, mas dever moral. O bispo de Hipona reconhece que, embora a guerra seja sempre uma consequência do pecado, pode ser instrumento legítimo para a restauração da ordem. Ele afirma que “a injustiça dos adversários obriga o sábio a travar guerras justas” (De Civitate Dei, XIX, 7). O pacifismo absoluto, portanto, contraria a própria doutrina agostiniana da guerra justa, que nunca foi abolição da força, mas legitimação do seu uso em defesa da justiça. A Revolução, em contraste, prega uma paz universal laica, igualitária e desarmada, que só pode advir da supressão de todas as soberanias, desigualdades e, em última análise, de toda a moral objetiva.

💔 A Falsa Misericórdia e a Moleza das Paixões

A confusão moderna entre misericórdia e pacifismo nasce de uma leitura sentimental e descontextualizada do Evangelho. Para Agostinho, a misericórdia é virtude eminentemente pessoal, ligada à correção fraterna e ao perdão de ofensas privadas (Sermones, 83, 4). Mas, no âmbito do governo e da sociedade, o mesmo Agostinho insiste que a autoridade deve punir os crimes graves para salvaguardar a comunidade (Epistula 138, ad Marcellinum). Assim, a misericórdia não pode anular a justiça quando a vida da coletividade está em jogo.

Essa distorção sentimental é, em si, um produto da Revolução nas tendências. A sensualidade, uma das paixões propulsoras do processo revolucionário, gera uma moleza de alma, um horror à dor, ao risco e ao sacrifício (Oliveira, 1998, p. 5). A figura do guerreiro, do mártir, do homem que arrisca a vida por um bem superior, torna-se incompreensível e odiosa para essa mentalidade. O pacifismo serve, então, como uma justificativa ideológica para a covardia e a busca de uma vida isenta de lutas, mascarando-as sob o véu de uma suposta virtude evangélica.

⚖️ A Ordem Justa e a Hierarquia do Bem Comum

Essa linha de pensamento foi aprofundada por São Tomás de Aquino, que sistematizou a doutrina da guerra justa na Suma Teológica (II-II, q.40). Três condições são necessárias: a autoridade legítima (auctoritas principis), uma causa justa e a intenção reta. A guerra justa não nasce do ódio, mas do zelo pela ordem e pelo bem comum. Tomás ainda distingue cuidadosamente entre o campo da moral pessoal e o da vida política: na esfera privada, a misericórdia e o perdão podem prevalecer; mas, na esfera pública, a justiça exige que o mal seja contido para proteger os inocentes (Tomás de Aquino, 2002).

As próprias condições tomistas pressupõem uma ordem social que a Revolução visa destruir. A "autoridade legítima" emana de Deus, princípio que a soberania popular revolucionária nega. A "causa justa" se fundamenta numa moral objetiva, que o relativismo liberal dissolve. A "intenção reta" requer um amor à ordem hierárquica, que o igualitarismo revolucionário abomina. O antimilitarismo da Revolução é, portanto, a consequência lógica de seu ódio a toda superioridade e a toda estrutura de autoridade (Oliveira, 1998, p. 27).

🛡️ A Tradição Cristã: Realismo contra Utopia

Os Padres e Doutores, portanto, não são porta-vozes do pacifismo absoluto, mas realistas morais que reconhecem o mal e prescrevem uma resposta proporcional. Como observa Santo Ambrósio, “quem não defende o próximo contra o injusto é tão culpado quanto aquele que o ataca” (De Officiis, I, 27, 129). Esta tradição patrística e escolástica desautoriza a passividade diante da violência: a omissão se converte em cumplicidade. Este realismo se opõe frontalmente ao otimismo utópico da Revolução, que nega a profundidade da malícia humana e crê ser possível construir uma sociedade perfeita sem a graça, apenas pela reestruturação das leis e da economia.

Em suma, a misericórdia é adequada e necessária nos pecados pessoais, onde resta espaço para conversão. Mas quando o mal se ergue contra a vida, a família, a Pátria e a própria Igreja, o dever não é a passividade do pacifismo, mas a firmeza da justiça, que pode exigir o uso legítimo da força. O pacifismo, como lema dos não pacíficos e arma psicológica para desarmar os bons, é uma distorção moderna que desarma os justos e fortalece os injustos, em ruptura direta com a tradição patrística e escolástica do cristianismo e em plena consonância com os objetivos finais do processo revolucionário.

📚 Referências

Agostinho. 2006. A Cidade de Deus. Trad. Oscar Paes Leme. São Paulo: Editora Vozes.
Ambrósio. 1997. De Officiis. Trad. Ivor J. Davidson. Oxford: Oxford University Press.
Oliveira, Plinio Corrêa de. 1998. Revolução e Contra-Revolução. 4ª ed. São Paulo: Artpress.
Tomás de Aquino. 2002. Suma Teológica. Trad. Alexandre Correia. São Paulo: Loyola.