22 set
S. Maurício e companheiros, Mártires


🛡️São Maurício era o comandante da lendária Legião Tebana, uma unidade do exército romano composta por cristãos do Alto Egito. No final do século III, sob o imperador Maximiano, a legião foi ordenada a marchar para a Gália para reprimir uma revolta. No entanto, quando receberam a ordem de participar em rituais pagãos e de perseguir a população cristã local, recusaram-se a obedecer. Por esta insubordinação, a legião foi "dizimada" – a cada décimo homem executado. Mesmo assim, encorajados por Maurício, permaneceram firmes na sua fé. O imperador, enfurecido, ordenou uma segunda dizimação e, finalmente, a execução de toda a legião, que contava com cerca de 6.600 homens. Sua célebre resposta ao imperador resume seu martírio: "Somos vossos soldados, Imperador, mas somos também, e acima de tudo, servos de Deus. A Vós devemos o serviço militar, a Ele devemos a inocência."

🎵Introito (Sl 78, 11, 12 e 10 | ib., 1)
Chegue à vossa presença, Senhor, o gemido dos cativos. Retribuí a nossos vizinhos, em seu íntimo, sete vezes cada injúria que eles Vos fizeram. Vingai o sangue de vossos Santos, que foi derramado. Sl. Ó Deus, os gentios invadiram a vossa herança, profanaram o vosso santo templo e reduziram Jerusalém a ruínas. ℣. Glória ao Pai.

📜Epístola (Apoc. 7, 13-17)
Naqueles dias: Um dos anciãos tomou a palavra e me disse: "Estes, que estão vestidos com vestes brancas, quem são e de onde vieram?" E eu lhe respondi: "Meu Senhor, tu o sabes." E ele me disse: "Estes são os que vieram da grande tribulação e lavaram suas vestes, e as branquearam no sangue do Cordeiro. Por isso, estão diante do trono de Deus e o servem dia e noite em seu templo; e aquele que está sentado no trono habitará com eles. Não terão mais fome, nem terão mais sede, nem o sol os queimará, nem qualquer calor; porque o Cordeiro, que está no meio do trono, os conduzirá e os levará às fontes das águas da vida, e Deus enxugará toda lágrima de seus olhos."

📖Evangelho (Lc 21, 9-19)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: Quando ouvirdes falar de guerras e de sedições, não vos assusteis. É necessário que estas coisas aconteçam primeiro; mas não virá logo o fim. E então dizia-lhes: Levantar-se-á nação contra nação e reino contra reino. Haverá grandes terremotos em vários lugares, pestes e fomes, e também coisas espantosas e no céu grandes sinais. Mas, antes de tudo isso, lançarão mão de vós e vos perseguirão, entregando-vos às sinagogas e aos cárceres, levando-vos à presença de reis e governadores, por causa de meu Nome. Isto vos será ocasião de dardes testemunho. Proponde, pois, em vossos corações não premeditar como haveis de responder. Porque eu vos darei palavras e sabedoria a que todos os vossos inimigos não poderão resistir nem contradizer. Sereis entregues até por vossos pais, irmãos, parentes e amigos. Farão morrer muitos de vós e sereis odiados por todos por causa de meu Nome. Mas não se perderá um só cabelo de vossa cabeça. Por vossa perseverança salvareis as vossas almas.

🤔Reflexões

✝️A perseverança prometida no Evangelho aos que são perseguidos por causa de Cristo é a chave para compreender a visão gloriosa da Epístola. Os mártires, como São Maurício e seus companheiros, são precisamente aqueles que viveram a "grande tribulação" e, por sua fidelidade até a morte, "lavaram suas vestes... no sangue do Cordeiro". A brancura de suas vestes não vem de uma pureza humana, mas da participação no sacrifício redentor de Cristo. São Beda explica que as vestes são branqueadas no sangue do Cordeiro pela fé e pelo testemunho do martírio, que une o sofrimento do fiel ao de Cristo (São Beda, Explanação do Apocalipse, sobre Ap 7, 14). A promessa de Cristo, "eu vos darei palavras e sabedoria", é a graça que sustenta o testemunho; não se trata de uma eloquência humana, mas da própria verdade de Cristo falando através deles, tornando sua confissão irrefutável (Santo Agostinho, Sermão 276). E a afirmação de que "não se perderá um só cabelo de vossa cabeça" não se refere à proteção física, mas à certeza da salvação eterna, onde nenhum dano real e definitivo pode atingir a alma que persevera em Deus (São Gregório Magno, Homilia 35 sobre os Evangelhos).

📜O discurso escatológico de Lucas encontra paralelos diretos em Mateus 24 e Marcos 13. No entanto, Mateus acrescenta a imagem de que todas essas tribulações "são o início das dores de parto" (Mt 24, 8), uma metáfora que sugere que o sofrimento do mundo e da Igreja é o prelúdio doloroso, mas esperançoso, do nascimento de um novo céu e uma nova terra. Marcos, por sua vez, ao descrever o testemunho perante as autoridades, especifica que o Espírito Santo falará através dos discípulos: "não sois vós que falais, mas o Espírito Santo" (Mc 13, 11), complementando a promessa de Jesus em Lucas de dar "palavras e sabedoria" ao atribuir diretamente essa assistência à Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.

✒️São Paulo aprofunda a teologia do sofrimento e da perseverança. Em Romanos, ele afirma que "os sofrimentos do tempo presente não têm comparação com a glória que se há de revelar em nós" (Rm 8, 18), conectando diretamente a tribulação terrena (Evangelho) com a recompensa celestial (Epístola). Ele descreve os apóstolos como "levando sempre em nosso corpo o morrer de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nosso corpo" (2Cor 4, 10), explicando o martírio não como uma simples derrota, mas como a máxima conformação com Cristo. A promessa final do Evangelho, "por vossa perseverança salvareis as vossas almas", ecoa no brado de vitória de Paulo: "Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Desde já me está reservada a coroa da justiça" (2Tm 4, 7-8).

🏛️Os documentos da Igreja, como o Martirológio Romano, sistematizam a memória dos mártires, apresentando seu sacrifício como o supremo ato de testemunho (martyria) da verdade do Evangelho. O Catecismo do Concílio de Trento ensina que os mártires são exemplos preeminentes da virtude da fortaleza, vivida em grau heroico através da graça divina, e que sua intercessão é poderosa junto de Deus. A compreensão de que o martírio é semente de novos cristãos, encapsulada na famosa frase de Tertuliano, "o sangue dos mártires é a semente da Igreja" (Apologeticum, 50), tornou-se um princípio fundamental, explicando como a perseguição, longe de destruir a fé, a fortalece e a propaga, como profetizado no Evangelho, onde a perseguição se torna "ocasião de dardes testemunho".