✍️São Lucas, médico de profissão em Antioquia, era um gentio culto convertido à fé cristã, tornando-se um fiel companheiro e colaborador de São Paulo em suas viagens missionárias, especialmente durante as dificuldades e prisões do Apóstolo, que o chamava de "o médico amado" (Col 4,14). Ele é o autor do terceiro Evangelho e dos Atos dos Apóstolos. Seu Evangelho, muitas vezes chamado de "o Evangelho da misericórdia", destaca-se pela ternura com que narra a infância de Jesus, pela atenção especial dedicada à Virgem Maria, às mulheres, aos pobres e aos pecadores arrependidos, como evidenciado nas parábolas do Filho Pródigo e do Bom Samaritano. Os Atos dos Apóstolos, por sua vez, são a crônica fundamental da Igreja primitiva, detalhando a difusão do cristianismo desde Jerusalém até Roma. Uma antiga tradição também o considera o primeiro pintor de ícones, atribuindo-lhe retratos da Virgem Maria. Dante Alighieri o descreveu poeticamente como o "scriba mansuetudinis Christi" (o escrivão da mansidão de Cristo), capturando a essência de sua obra. Segundo a tradição, sofreu o martírio por enforcamento numa oliveira em Acaia, Grécia, por volta do ano 84.
📖Epístola (II Cor 8, 16-24)
Irmãos: Dou graças a Deus, que pôs no coração de Tito a mesma solicitude por vós. Porque não só anuiu à minha exortação, como, sendo ainda mais zeloso, por sua vontade partiu a visitar-vos. Enviamos também com ele um irmão, que é louvado pela pregação do Evangelho em todas as Igrejas e não somente isto, mas também foi escolhido pelas Igrejas para companheiro de nossa peregrinação, nesta obra de caridade por nós ministrada para glória do Senhor, como testemunho de nossa boa vontade. Com isto queremos evitar que alguém nos censure por causa da abundante esmola que por nós, vos é ministrada. Porque procuramos fazer o bem, não só diante de Deus, como também diante dos homens. Enviamos ainda com eles outro irmão nosso, que em muitas coisas, várias vezes reconhecemos ser diligente e agora o será muito mais, pela muita confiança que tem em vós. Seja assim, por Tito, que é meu companheiro e colaborador junto de vós; seja por nossos irmãos Apóstolos das Igrejas e glória do Cristo. Manifestai, pois, perante as Igrejas, qual é a vossa caridade para com eles e porque nos gloriamos de vós.
✝️Evangelho (Lc 10, 1-9)
Naquele tempo, designou o Senhor outros setenta e dois discípulos e mandou-os, dois a dois, em sua frente, por todas as cidades e lugares onde Ele próprio devia ir. Ele lhes dizia: A messe é grande, mas os operários são poucos. Rogai, pois, ao dono da seara que mande operários para sua messe. Ide, eis que vos envio como cordeiros para o meio de lobos. Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado e pelo caminho a ninguém saudeis. Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz seja nesta casa. E se aí houver um filho da paz, repousará sobre ele a vossa paz; se não, voltará ela para vós. Na mesma casa ficai, comendo e bebendo do que eles tiverem, pois o operário merece seu salário. Não andeis de casa em casa. E se entrardes em alguma cidade e vos receberem, comei o que vos derem. Curai os enfermos que aí houver e dizei-lhes: Aproximou-se de vós o Reino de Deus.
🙏Reflexões
📜Ao enviar os setenta e dois discípulos, o Senhor prefigura a universalidade da pregação apostólica, que não se restringe aos Doze. São Gregório Magno ensina que, assim como os Apóstolos representam os bispos, os setenta e dois discípulos simbolizam os presbíteros, os cooperadores da segunda ordem, enviados para preparar o caminho do Senhor. A instrução "a ninguém saudeis pelo caminho" não é uma ordem contra a caridade, mas um preceito contra a distração e a perda de tempo em assuntos mundanos quando a urgência da pregação do Reino está em jogo. São Lucas, ao registrar este episódio, não apenas narra um evento, mas define a identidade do missionário: um operário que depende da providência, um portador da paz de Cristo e um anunciador da proximidade do Reino de Deus. O próprio Lucas viveu este envio, não como um dos setenta e dois originais, mas como um evangelista cujo trabalho escrito se tornou um instrumento perene para que o Senhor pudesse "entrar" em inúmeras cidades e corações ao longo dos séculos. (São Gregório Magno, Homilias sobre os Evangelhos, Homilia 17).
✉️Muitos Padres da Igreja, como São João Crisóstomo, identificam o "irmão, que é louvado pela pregação do Evangelho em todas as Igrejas", mencionado por São Paulo na epístola, como o próprio São Lucas. Esta passagem torna-se, assim, um testemunho apostólico direto sobre o evangelista. O louvor não se devia apenas à sua pregação oral, mas, sobretudo, ao seu Evangelho escrito, que já começava a ser difundido e estimado. A confiança que São Paulo deposita nele para a administração da coleta ("obra de caridade") revela a integridade e a diligência de São Lucas, características que ele certamente aplicou com ainda maior zelo na tarefa de investigar e registrar com fidelidade os fatos da vida de Cristo e da Igreja nascente. Ele é, portanto, o modelo do colaborador apostólico cuja glória não é própria, mas reflexo da "glória de Cristo". (São João Crisóstomo, Homilias sobre a Segunda Epístola aos Coríntios, Homilia 18).
🏛️O Catecismo Romano, ao expor sobre a apostolicidade da Igreja, afirma que ela é edificada sobre o fundamento dos Apóstolos e persevera em sua doutrina, comunhão e sucessão. A obra de São Lucas, especialmente os Atos dos Apóstolos, constitui a principal fonte histórica que documenta esta verdade de fé, narrando como o mandato de Cristo, registrado no Evangelho de hoje, foi levado a cabo por Pedro, Paulo e os demais. O envio dos discípulos "a todas as cidades e lugares" encontra seu eco magisterial em documentos como a Encíclica Maximum Illud de Bento XV, que reitera a perene urgência da missão ad gentes. São Lucas, um gentio que escreveu para gentios, personifica o cumprimento desta missão universal, demonstrando que a messe do Senhor transcende fronteiras étnicas e culturais e que o Evangelho é destinado a todos os povos, um princípio que o Magistério da Igreja sempre defendeu como essencial à sua natureza.