📖Epístola (Fl 3, 17-21; 4, 1-3)
Irmãos: Sede meus imitadores e observai os que andam conforme o exemplo que tendes visto em mim. Pois muitos há, de quem muitas vezes vos tenho falado (e ainda agora falo com lágrimas), que procedem como inimigos da Cruz de Cristo. O fim deles é a perdição; têm por Deus o ventre; gloriam-se daquilo de que se deviam envergonhar, gostando somente das coisas terrenas. Quanto a nós, o nosso viver é nos céus, de onde também esperamos o Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante a seu corpo glorificado, pelo poder que tem de sujeitar a Si todas as coisas. Portanto, irmãos meus, muito amados e queridos, alegria e coroa minha, permanecei assim firmes no Senhor, caríssimos. Rogo a Evódia e suplico a Síntique que sejam unidas no Senhor. E peço também a ti, meu fiel companheiro, que as ajudes, porque comigo trabalharam em prol do Evangelho com Clemente e meus outros colaboradores, cujos nomes estão no livro da vida.
✝️Evangelho (Mt 9, 18-26)
Naquele tempo, falava Jesus ao povo quando se aproximou d’Ele um príncipe da sinagoga e O adorou, dizendo: Senhor, agora mesmo faleceu a minha filha, mas vinde, imponde a vossa mão sobre ela e viverá. Jesus levantou-se e seguiu-o com os seus discípulos. E eis que uma mulher, que havia doze anos padecia de um fluxo de sangue, chegou-se por detrás d’Ele e tocou-Lhe na orla do vestido. Porque dizia consigo: Se eu tão somente tocar no seu vestido, ficarei curada. Voltou-se Jesus, e vendo-a, disse: Tem confiança, filha, tua fé te salvou. E naquela hora a mulher foi curada. Quando Jesus chegou à casa do príncipe, e viu os tocadores de flauta e muita gente em alarido, disse-lhes: Retirai-vos, porque a menina não está morta, mas dorme. E riram-se d’Ele. Mas depois que fez sair a gente, Jesus entrou, tomou a menina pela mão, e ela se levantou. E divulgou-se a notícia deste milagre por toda aquela região.
🙏Reflexões
✨O Evangelho de hoje nos apresenta dois milagres entrelaçados, ambos nascidos de um toque de fé. O chefe da sinagoga busca o toque impositivo de Cristo para sua filha morta, enquanto a mulher com fluxo de sangue busca, em segredo, tocar a orla de Suas vestes. Em ambos os casos, a fé é o canal pelo qual o poder divino flui. Santo Agostinho, meditando sobre a mulher hemorroíssa, distingue o toque da multidão do toque da fé: “A multidão O aperta, mas só ela O toca”. Muitos se aproximam de Cristo por curiosidade ou costume, mas poucos O “tocam” com uma fé viva e pessoal que espera d’Ele a salvação. Esta mulher, impura segundo a Lei e marginalizada pela sociedade, ensina-nos que a verdadeira fé não se detém em barreiras, mas rompe o véu da condição humana para alcançar o Divino. Ela não pede, não grita; ela age com a certeza interior de que o simples contato com o sagrado a restaurará. Esta é a fé que salva, uma confiança total que move a mão de Deus.
⚔️A Epístola de São Paulo ressoa profundamente com a cena do Evangelho, ao contrastar dois modos de vida: o dos “inimigos da Cruz” e o dos “cidadãos dos céus”. Os que zombam de Jesus na casa do príncipe, os tocadores de flauta e a multidão em alarido, representam a mentalidade terrena que vê a morte como o fim absoluto e ri da esperança divina. Eles são a imagem daqueles de quem Paulo fala com lágrimas, cujo “deus é o ventre” e que “só gostam das coisas terrenas”. Por outro lado, o chefe da sinagoga e a mulher doente encarnam a cidadania celeste. Mesmo diante do desespero — a morte e a doença crônica —, eles não se fixam na realidade terrena, mas elevam seu olhar para Cristo, o Salvador esperado dos céus. O Catecismo da Igreja Católica nos ensina que “a fé é a resposta do homem a Deus que se revela e a ele se doa, trazendo ao mesmo tempo uma luz superabundante ao homem em busca do sentido último da sua vida” (CIC 26). A fé destes dois protagonistas do Evangelho é precisamente esta resposta que abre as portas para a luz de Cristo dissipar as trevas da morte e do sofrimento.
⚓Esta liturgia, portanto, nos mergulha na essência da esperança cristã. A ressurreição da menina não é apenas um milagre do passado, mas um sinal profético da nossa própria ressurreição, como afirma São Paulo: “Ele transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante a seu corpo glorificado”. A paz anunciada no Introito não é a ausência de provações, mas a certeza da presença de Cristo que caminha conosco através delas. São Tomás de Aquino define a esperança como a virtude teologal pela qual desejamos o Reino dos céus e a vida eterna como nossa felicidade, apoiando-nos não em nossas forças, mas no auxílio da graça do Espírito Santo (Summa Theologiae, II-II, q. 17, a. 1). A fé do chefe da sinagoga e da mulher doente é a semente da esperança que floresce em milagre. Somos chamados, neste domingo, a examinar nossa própria vida: vivemos como inimigos da Cruz, apegados ao que é passageiro e rindo da promessa de vida eterna, ou como cidadãos dos céus, tocando Cristo com fé diária, buscando Nele a cura para nossas enfermidades e a paz para nossas aflições, firmes na esperança de que nossos nomes, também, estão “escritos no livro da vida”?