🕯️A Vigília de Todos os
Santos é um dia de preparação espiritual para a grande solenidade que celebra a
Igreja Triunfante. Tradicionalmente, este dia era marcado pelo jejum e pela
oração, um costume que reflete a importância de purificar a alma para contemplar
a glória dos santos no céu. A liturgia nos convida a meditar sobre o destino
final para o qual fomos criados: a comunhão eterna com Deus, na companhia de
todos aqueles que, tendo vivido heroicamente a fé na terra, agora intercedem por
nós. É uma antecipação da alegria celestial, um momento para ajustar nosso
coração ao chamado universal à santidade, reconhecendo que a coroa da glória é
precedida pela cruz da perseverança e do amor fiel a Cristo.
📖Epístola
(Ap 5, 6-12)
Naqueles dias, eu, João, vi no meio do trono, dos quatro
Animais e no meio dos Anciãos um Cordeiro de pé, como que imolado. Tinha ele
sete chifres e sete olhos (que são os sete Espíritos de Deus, enviados por toda
a terra). Veio e recebeu o livro da mão direita do que se assentava no trono.
Quando recebeu o livro, os quatro Animais e os vinte e quatro Anciãos
prostraram-se diante do Cordeiro, tendo cada um uma cítara e taças de ouro
cheias de perfume (que são as orações dos santos). Cantavam um cântico novo,
dizendo: Tu és digno de receber o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste
imolado e resgataste para Deus, ao preço de teu sangue, homens de toda tribo,
língua, povo e raça; e deles fizeste para nosso Deus um reino de sacerdotes, que
reinam sobre a terra. Na minha visão ouvi também, ao redor do trono, dos Animais
e dos Anciãos, a voz de muitos anjos, em número de miríades de miríades e de
milhares de milhares, bradando em alta voz: Digno é o Cordeiro imolado de
receber o poder, a riqueza, a sabedoria, a força, a honra, a glória e o
louvor.
✝️Evangelho (Lc 6, 17-23)
Naquele tempo, descendo com
eles, parou numa planície. Aí se achava um grande número de seus discípulos e
uma grande multidão de pessoas vindas da Judeia, de Jerusalém, da região
marítima, de Tiro e Sidônia, que tinham vindo para ouvi-lo e ser curadas das
suas enfermidades. E os que eram atormentados pelos espíritos imundos ficavam
livres. Todo o povo procurava tocá-lo, pois saía dele uma força que os curava a
todos. Então ele ergueu os olhos para os seus discípulos e disse:
Bem-aventurados vós que sois pobres, porque vosso é o Reino de Deus!
Bem-aventurados vós que agora tendes fome, porque sereis fartos! Bem-aventurados
vós que agora chorais, porque vos alegrareis! Bem-aventurados sereis quando os
homens vos odiarem, vos expulsarem, vos ultrajarem, e quando repelirem o vosso
nome como infame por causa do Filho do Homem! Alegrai-vos naquele dia e exultai,
porque grande é o vosso galardão no céu. Era assim que os pais deles tratavam os
profetas.
🕊️Reflexões
✨A liturgia desta Vigília
estabelece um diálogo sublime entre o céu e a terra, conectando o sofrimento
redentor dos justos com a glória eterna da corte celestial. O Evangelho de Lucas
apresenta o caminho da santidade através das bem-aventuranças: a pobreza, a
fome, o choro e a perseguição por amor a Cristo. Este não é um caminho de glória
terrena, mas um itinerário de configuração ao próprio Cristo sofredor. Em
contrapartida, a Epístola do Apocalipse revela o destino final deste caminho: a
participação na liturgia celeste. As "taças de ouro cheias de perfume, que são
as orações dos santos", mostram que os sofrimentos e súplicas dos que vivem as
bem-aventuranças na terra ascendem a Deus como um aroma agradável, unindo-se ao
louvor incessante dos anjos e anciãos. A Vigília nos convida a ver nossas lutas
presentes não como um fim em si mesmas, mas como a matéria-prima de nossa
santificação e como nossa contribuição para o perfume que enche as taças de ouro
diante do trono de Deus.
🐑No centro de ambas as leituras está a
figura do "Cordeiro como que imolado". Ele é a chave para compreender o paradoxo
das bem-aventuranças. Cristo foi o mais pobre, o que mais teve fome e sede de
justiça, Aquele que chorou sobre Jerusalém e foi odiado, expulso e ultrajado até
a morte. Ao abraçar esta condição, Ele transformou o sofrimento em via de
redenção. Santo Agostinho ensina que a humildade é o fundamento de todas as
bem-aventuranças: "A bem-aventurança começa pela humildade... Se desejas atingir
a altitude, começa por baixo. Se pensas em construir um edifício de grande
altura, pensa primeiro no fundamento da humildade" (Santo Agostinho, Sermão 69).
O "grande galardão no céu" prometido por Jesus não é uma recompensa extrínseca,
mas a própria união com o Cordeiro, cuja pobreza nos enriqueceu e cujas chagas
nos curaram. O Catecismo da Igreja Católica reforça que as bem-aventuranças
"revelam o objetivo da existência humana, o fim último dos atos humanos: Deus
nos chama à sua própria bem-aventurança" (CIC, 1719), um chamado que se realiza
plenamente na visão do Cordeiro glorificado.
🎶A visão de São João no
Apocalipse não é apenas uma promessa futura, mas uma realidade presente que
sustenta a esperança da Igreja peregrina. O "cântico novo" entoado no céu
celebra a obra redentora de Cristo, que resgatou "homens de toda tribo, língua,
povo e raça" e fez deles um "reino de sacerdotes". Este sacerdócio real,
recebido no batismo, capacita cada fiel a oferecer sua própria vida – com suas
alegrias e, especialmente, com suas cruzes – como um sacrifício espiritual unido
ao do Cordeiro. O Missal Romano, no Prefácio dos Santos I, afirma que nos santos
Deus nos oferece "um exemplo, em sua intercessão uma ajuda e na comunhão de
graça uma aliança". Eles são a prova viva de que viver as bem-aventuranças é
possível pela graça que emana de Cristo, a "força que saía dele e curava a
todos". Assim, a Vigília de Todos os Santos nos impulsiona a viver o hoje com os
olhos fixos no céu, transformando as planícies de nossas lutas terrenas no átrio
do templo celestial, onde um dia esperamos cantar eternamente a dignidade do
Cordeiro imolado.