🙏Esta liturgia do décimo domingo depois de Pentecostes não celebra um santo específico, mas concentra-se na virtude teologal da humildade como pilar da vida cristã. A temática central, "Deus resiste aos soberbos e dá a sua graça aos humildes", é explorada em todas as leituras, culminando na parábola do fariseu e do publicano, que serve como um ensinamento direto de Cristo sobre a verdadeira atitude do coração diante de Deus, contrastando a autossuficiência orgulhosa com o arrependimento humilde.
📖 Introito (Sl 54, 17-18, 20 e 23 | ib., 2) (Áudio)
Dum clamárem ad Dóminum, exaudívit vocem meam, ab his, qui appropínquant mihi... Clamei ao Senhor, e Ele ouviu a minha voz e me livrou daqueles que me perseguem. E humilhou-os O que existe antes dos séculos, e subsistirá para sempre. Descansa no Senhor os teus cuidados, e Ele mesmo te nutrirá. Sl. Ouvi, ó Deus, a minha oração, e não desprezeis a minha súplica; atendei-me e escutai-me.
🕊️ Epístola (I Cor 12, 2-11)
Irmãos: Sabeis, que, quando pagãos, vos deixastes conduzir, como o quiseram, aos ídolos mudos. Por isso vos faço saber que ninguém, falando pelo Espírito de Deus, profere maldições contra Jesus. E ninguém pode dizer-. Senhor Jesus, senão pelo Espírito Santo. Há realmente diversidade de graças, mas há um só Espírito. Há diversidade de ministérios, mas um mesmo é o Senhor. E há diversidade de operações mas um mesmo é o Deus, que tudo em todos opera. A cada um, porém, é dada a manifestação do Espírito para utilidade [comum]. Assim a um é concedida pelo Espírito a palavra da sabedoria, a outro, a palavra da ciência, pelo mesmo Espírito; a um terceiro, a fé pelo mesmo Espírito; a um, a graça de curar doenças no mesmo Espírito, a outro, o dom dos milagres; a este, o dom da profecia, àquele o discernimento dos espíritos; ainda a um, o dom das línguas, e a outro, a interpretação das palavras. Todas estas coisas, porém, opera o mesmo Espírito, que distribuí a cada um como quer.
✝️ Evangelho (Lc 18, 9-14)
Naquele tempo, disse Jesus esta parábola a alguns que se tinham a si mesmos em conta de justos, e desprezavam os outros: Dois homens subiram ao templo para orar; um era fariseu, e o outro, publicano O fariseu, de pé, orava assim em seu íntimo: Graças Vos dou, ó Deus, porque não sou como os demais homens: como os ladrões, injustos, adúlteros, nem como este publicano. Jejuo duas vezes na semana; dou o dízimo de tudo quanto possuo. O publicano, porém, ficando de longe, nem ousava levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, sede propício a mim pecador. Digo-vos que este voltou justificado para sua casa, e aquele, não; porque o que se eleva, será humilhado, e o que se humilha, será exaltado.
🤔 Reflexões
📜O fariseu não estava realmente a orar a Deus, mas a elogiar-se a si mesmo; ele estava perto de si, mas longe de Deus (Santo Agostinho, Sermão 115). A soberba torna inúteis as obras que, de outro modo, seriam admiráveis, pois o que pode ser mais louvável do que o jejum e o dízimo? No entanto, a soberba arruinou tudo (São João Crisóstomo, Homilia 3 sobre a Incompreensível Natureza de Deus). A diversidade das graças, como os dons descritos na epístola, é ordenada para a utilidade da Igreja inteira; assim, ninguém deve se ensoberbecer por um dom que recebeu, pois não o recebeu para seu próprio bem, mas para o bem de todos (São Tomás de Aquino, Suma Teológica, II-II, q. 171, a. 3).
📖A parábola do fariseu e do publicano é exclusiva do Evangelho de Lucas, destacando seu foco na misericórdia de Deus para com os pecadores e os marginalizados. No entanto, o tema da humildade é central em outros evangelhos. Mateus registra o ensinamento de Jesus de que "aquele que se humilhar como esta criança, esse é o maior no Reino dos Céus" (Mt 18, 4) e a bem-aventurança aos "pobres de espírito" (Mt 5, 3). Marcos enfatiza a mesma lição com a exortação: "Se alguém quer ser o primeiro, seja o último de todos e o servo de todos" (Mc 9, 35). João apresenta a lição de humildade de forma prática, através do gesto de Cristo lavando os pés dos discípulos, um ato de serviço supremo (Jo 13, 1-17).
✒️A advertência do Evangelho contra a autojustificação ecoa fortemente nos escritos de São Paulo. A própria epístola do dia (I Cor 12) serve de contraponto à soberba, ao ensinar que os dons espirituais, por mais diversos que sejam, provêm de um único Espírito para o bem comum, não para a glória individual. Em sua carta aos Filipenses, Paulo oferece o exemplo supremo de humildade, a de Cristo, que "se esvaziou a si mesmo, assumindo a condição de servo" e exorta os fiéis a terem "o mesmo sentimento", considerando os outros superiores a si mesmos (Fp 2, 3-7). Aos Romanos, ele adverte diretamente: "não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação" (Rm 12, 3), condenando a atitude do fariseu.
🏛️A doutrina sobre a humildade como virtude essencial para a justificação está firmemente estabelecida nos documentos da Igreja. O Catecismo Romano, ao tratar da Penitência, descreve a contrição necessária para o perdão dos pecados como um ato que exige o reconhecimento humilde da própria culpa e a confiança na misericórdia de Deus, a mesma atitude do publicano. A Regra de São Bento detalha um caminho espiritual através de doze graus de humildade, considerando-a a escada pela qual se sobe ao céu, em contraste com a soberba que precipita na queda. Encíclicas papais, como a Ad Beatissimi Apostolorum de Bento XV, alertam contra a soberba e o individualismo como raízes dos males sociais, propondo a caridade e a humildade cristãs como remédio.