02 SET - S. ESTÊVÃO REI, Confessor


👑Nascido pagão, Estêvão tornou-se o primeiro Rei da Hungria e, por sua obra, o apóstolo de seu povo. Governou com extraordinária sabedoria e justiça, consolidando o reino sob a fé cristã. Fundou dioceses e mosteiros, promoveu a caridade para com os pobres e viúvas, e viveu uma profunda vida de oração, oferecendo seu reino à Santíssima Virgem Maria. Sua vida encarna o ideal do monarca cristão que utiliza o poder temporal como um dom de Deus para a salvação das almas, multiplicando os talentos que lhe foram confiados para a glória de Deus e o bem de seu povo.

🙏 Introito (Sl 78, 11. 12 e 10 | ib., 1 )
Os justi meditábitur sapiéntiam, et lingua ejus loquétur judícium... A boca do justo fala a sabedoria e a sua língua profere a equidade. A lei de seu Deus está em seu coração. Sl. Não tenhas ciúmes dos maus, nem tenhas inveja dos que praticam a iniquidade. ℣. Glória ao Pai.

📜 Epístola (Eclo 31, 8-11)
Bem-aventurado o homem que foi encontrado sem mancha, que se não deixou atrair pelo ouro, nem pôs sua esperança no dinheiro ou em riquezas. Quem é este, para nós o louvarmos? Porque fez coisas maravilhosas em sua vida. O que assim foi provado e encontrado perfeito, terá uma glória eterna. Pôde transgredir a lei de Deus, e não a transgrediu; pôde praticar o mal e não o fez. Por isso o bem que fez, se firmou no Senhor, e toda a assembléia dos Santos falará das suas esmolas.

📖 Evangelho (Lc 19, 12-26)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos esta parábola: Um homem, de nobre linhagem, retirou-se para uma região longínqua a fim de receber um reino e depois regressar. Chamando dez de seus servos, deu-lhes dez minas, [moedas de prata] e lhes disse: Negociai com elas, até que eu regresse. Seus concidadãos, porém, o odiavam e lhe enviaram uma embaixada, dizendo: Nós não queremos que este homem reine sobre nós. Ora, aconteceu que ele voltou, após ter tomado posse de seu reino, e ordenou que chamassem os servos aos quais dera o dinheiro, para saber como eles o tinham valorizado. Apresentou-se, pois, o primeiro, dizendo: Senhor, a tua mina produziu dez minas. E ele respondeu: Está bem, servo bom, porque foste fiel em pouca coisa, terás poder sobre dez cidades. Veio o segundo e disse: Senhor, a tua mina produziu cinco minas. E ele lhe disse: E tu, sê o senhor de cinco cidades. Um outro veio depois, dizendo: Senhor, eis a tua mina que eu guardei, envolta num lenço, porque tinha medo de ti, por seres um homem severo; tiras o que não depositaste e recolhes o que não semeaste. Disse-lhe ele: Por tua própria boca, eu te julgo, servo mau. Sabias que sou um homem severo, tirando o que não depositei e recolhendo o que não semeei. Por que então não puseste o meu dinheiro num banco, a fim de que, em meu regresso, eu o retirasse com os juros? E aos que estavam presentes, disse: Tomai-lhe a mina, e dai-a ao que tem dez. E eles disseram: Senhor, este já possui dez minas. Eu vos digo, retrucou o Senhor: dar-se-á ao que já tem e ele ficará na abundância, mas ao que não tem, tomar-se-á mesmo o que possui.

💡 Reflexões

🧠A mina distribuída igualmente a todos os servos representa a Palavra de Deus ou o dom da fé, que é oferecido a todos, mas cujo fruto depende do zelo e esforço de cada um. Santo Estêvão, recebendo a "mina" da autoridade real, não a escondeu, mas a negociou para converter todo um reino. O temor do servo negligente é a desculpa da preguiça, pois o verdadeiro temor de Deus inspira a ação, não a paralisia; assim, quem recebe dons, especialmente o poder, deve usá-los para o serviço divino, sob pena de ser julgado não por ter feito o mal, mas por não ter feito o bem que podia (Santo Ambrósio, Exposição sobre o Evangelho de Lucas). O homem de nobre linhagem é Cristo, que ascendeu ao céu para receber o Reino, e os servos são os pregadores e líderes da Igreja, a quem Ele confia os dons para a edificação dos fiéis, representados pelo lucro das minas (São Beda, Homilias sobre os Evangelhos). A riqueza que não corrompe, louvada na Epístola, é aquela usada como instrumento para o Reino de Deus, pois o governante justo não deposita sua esperança no tesouro, mas o utiliza para o bem comum, tornando-se perfeito não por não possuir, mas por não ser possuído por suas riquezas (São Gregório Magno, Regra Pastoral).

🔄O Evangelho de São Lucas apresenta a Parábola das Minas, que se assemelha à Parábola dos Talentos em São Mateus (Mt 25, 14-30), mas com distinções cruciais. Em Lucas, cada servo recebe a mesma quantia (uma mina), enfatizando a igualdade fundamental dos dons da graça, enquanto em Mateus, os servos recebem quantias diferentes (cinco, dois e um talento) "segundo a sua capacidade", sublinhando a diversidade de dons. Além disso, Lucas introduz um elemento político ausente em Mateus: os concidadãos que odeiam o nobre e rejeitam seu reinado ("Não queremos que este homem reine sobre nós"), uma clara alusão à rejeição de Cristo por parte do mundo e de seu próprio povo. A recompensa em Lucas é também mais concreta e governamental, sendo o domínio sobre cidades, ao passo que em Mateus é a participação na "alegria do seu Senhor".

💌O Apóstolo São Paulo aprofunda o princípio da administração fiel dos dons divinos. Em sua Primeira Epístola aos Coríntios, ele afirma diretamente o que a parábola ensina: "O que se requer dos administradores é que sejam fiéis" (1Cor 4, 2). Ele também detalha a natureza desses dons, explicando que há "diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo" (1Cor 12, 4), e que eles são concedidos para "o bem comum". Essa teologia paulina oferece o propósito por trás das "minas" distribuídas pelo Senhor: não para benefício próprio, mas para a edificação da Igreja. A advertência final do Senhor na parábola ecoa o ensinamento de Paulo sobre o juízo final, onde "todos havemos de comparecer ante o tribunal de Cristo, para que cada um receba o que mereceu, fazendo o bem ou o mal, enquanto estava no corpo" (2Cor 5, 10).

🏛️Os documentos do Magistério da Igreja solidificam a doutrina sobre a responsabilidade dos governantes, personificada em Santo Estêvão. A Encíclica Diuturnum Illud do Papa Leão XIII afirma que toda autoridade civil provém de Deus e, portanto, aqueles que a exercem são ministros de Deus. Isso reflete a parábola, onde os servos (governantes) devem prestar contas ao "homem de nobre linhagem" (Cristo Rei) pelo uso do poder que lhes foi confiado. A Encíclica Immortale Dei, do mesmo pontífice, ensina que o Estado tem o dever de prestar culto público a Deus, pois dele depende. Santo Estêvão aplicou este princípio ao fazer da Hungria um reino cristão, "negociando" sua autoridade para produzir frutos espirituais, em contraste direto com a mentalidade condenada no Syllabus Errorum de Pio IX, que propõe um Estado indiferente à religião e fonte de seus próprios direitos.